sexta, 19 de abril de 2024
João Baptista Peixoto Neto

Entrevista: João Baptista Peixoto Neto, sócio-diretor da Ouro Preto Investimentos

06 agosto 2020 - 13h42Por Redação SpaceMoney

Sócio e diretor de compliance da Ouro Preto Investimentos, João Baptista Peixoto Neto é formado em Direito pela Faculdade de Direito do Largo do São Francisco da USP (Universidade de São Paulo), além de mestre em Direito Internacional pela mesma universidade. Também é especialista em Produtos Financeiros e Gestão de Riscos pela FIA/FEA/USP. Com a experiência na criação de mais de 300 fundos de investimento, conversamos com o especialista sobre investimentos, inovação nos mercados e mercado de crédito.

Qual é a estratégia de distribuição dos fundos da Ouro Preto Investimentos? Como aumentar a presença junto ao investidor pessoa física?

Os fundos da Ouro Preto Investimentos já estão nas principais plataformas de investimento. O nosso objetivo é colocar os nossos fundos em todas elas. Temos fundos de todas classes: de ações, multimercados, de renda fixa, de direitos creditórios, de investimento no exterior, de imóveis, e esperamos abrir um grande leque de distribuidores. 

Neste caso, o propósito é ofertar principalmente os fundos destinados ao público em geral (varejo) e aqueles para investidores qualificados. Temos em andamento dois grandes projetos, cada qual com o propósito de captação de cerca de 500 milhões de reais: um fundo que será listado na B3, destinado a investidores qualificados,  e um fundo aberto, conservador, destinado exclusivamente a um público de varejo, com um valor mínimo de aplicação no valor de R$ 100,00. Esperamos colocar esses dois fundos nas plataformas mais populares.

Também estamos lançando vários fundos destinados exclusivamente a investidores profissionais, que, em geral, são ofertas baseadas na instrução 476 da CVM (na forma de esforços restritos). São investidores que aplicam mais de 10 milhões nos mercados financeiro e de capitais. Fundos que, obviamente, devem proporcionar maiores retornos ao cotista e, é claro, possuem também maiores riscos. Por isso mesmo, destinados apenas a essa categoria de profissionais.

A gestora foi pioneira ao estruturar um fundo para captar recursos para um clube de futebol. Essa solução pode se tornar mais frequentemente usada considerando as dificuldades impostas pela pandemia às receitas esportivas? Quais são os planos nessa seara?

Sim. Já fomos procurados por vários clubes de futebol e estamos estudando a criação de outros fundos para o setor desportivo. Os clubes deverão passar a acessar o mercado de capitais por meio de operações como esta, que envolveu a criação de um FIDC (Fundo de Investimento em Direitos Creditórios).

A Ouro Preto Investimentos também inova ao investir em startups. Como é a seleção dos projetos para recebimento de aportes? Há planos de expandir essa atuação? Qual a perspectiva desse tipo de investimento para a diversificação da carteira de pessoas físicas?

A gestora tem um fundo de private equity, um FIP (Fundo de Investimento em Participações, pelo qual está investindo em cerca de 15 empresas de capital fechado. 

O nosso objetivo é investir em pelo menos 30 empresas de capital fechado até meados de 2021. Trata-se de um fundo cujo investimento o mercado chama de “capital semente”, ou seja, um investimento realizado na fase inicial de uma startup, antes mesmo dela ter lançado no mercado um produto mínimo variável (mais conhecido como MVP, na sigla em inglês). 

Nós temos também cerca de R$ 1 bilhão investidos em diversas empresas de capital fechado, por intermédio de vários outros fundos de private equity. Mas são investimentos em empresas já maduras e consolidadas em seus respectivos mercados, cujo desinvestimento se dará por meio de uma operação de fusões e aquisições (M&A, na sigla em inglês] ou abertura de capital.

O senhor também atua no mercado editorial. A gestora tem planos de lançar fundos nessa área?

Sim. Já registramos na CVM o único FICART, ou seja, fundo de investimento em cultura e arte, existente no mercado. O Ouro Preto FICART é um fundo destinado a investir apenas na edição de livros.

O nosso objetivo é fazer parcerias com as mais importantes editoras do mercado para financiar a edição de livros de importância cultural. Ou seja, livros que possamos classificar como livro de “alta cultura”, destinados a um público intelectualizado.

Por que destinados a  um “público intelectualizado”? Porque se o país não conseguir educar esse público que tem ambições intelectuais, um público letrado, mais inteligente e culto do que a média da população, certamente o Brasil não terá nenhum sucesso em educar o grande público, composto de pessoas mais simples e com menos ambições intelectuais. Um dos equívocos educacionais do Brasil foi querer educar a população inteira antes mesmo de formar tal elite intelectual. 

Mesmo hoje em dia, com a proliferação de faculdades no lugar de escolas profissionalizantes, difundiu-se a idéia de que cultura é um produto de supermercado, um bem econômico que se distribui à população como se entrega uma “cesta básica” , em vez de entender que, para obter sucesso no campo intelectual, o indivíduo deve atuar de forma ativa e não passiva, ou seja, ele deve ter um desejo genuíno de conhecimento, um compromisso com a verdade e uma honestidade intelectual, característicos de quem deseja ter uma verdadeira “vida intelectual”, seja ele um clérigo, um cientista, um filósofo ou qualquer pessoa que tenha ambição de ter conhecimento a respeito do que quer que seja.  

Há inúmeros livros de valor cultural, destinados a tal público, que pretendemos editar, que nunca foram publicados no país ou estão com as suas edições esgotadas. Ao longo de dez anos, esperamos conseguir editar cerca de 4 mil títulos que consideramos de grande importância, principalmente nas áreas de Literatura, História, Filosofia, Antropologia, Política, Sociologia, Psicologia, Crítica Cultural e Economia.

Outra linha de atuação da Ouro Preto Investimentos é a gestão de patrimônio financeiro de pessoas e famílias. Quais são os planos para a atuação nessa área? Quais as diferenças para os clientes ao terem o assessoramento da gestora em relação aos privates dos grandes bancos e corretoras?

Nós temos vários fundos exclusivos, ou seja, fundos com um único cotista, e fundos restritos a grupos familiares ou empresariais.

Estamos agora lançando um novo produtos, que serão as “carteiras administradas”. Carteira administrada nada mais é do que a gestão de um portfólio de investimentos de uma pessoa física ou jurídica. Uma gestão feita em nome do próprio cliente, seja ele uma pessoa física ou jurídica. É diferente da gestão de um fundo de investimento, pois o fundo é um condomínio de recursos, ou seja, é a reunião do patrimônio financeiro de diversos cotistas.

A diferença para o cliente do assessoramento pela gestora em relação aos “privates” dos grandes bancos e corretoras é a liberdade e a falta de conflitos de interesses. Em geral, as grandes instituições estão mais interessadas em vender os seus próprios produtos de investimentos que, na maioria das vezes, não são os melhores. No nosso caso, iremos em busca das melhores oportunidades, dos melhores ativos, da melhor relação risco/retorno para os nossos clientes, não importando quem sejam os estruturadores, emissores, gestores ou administradores dos ativos. Essa independência é o que caracteriza e talvez seja a maior virtude de gestoras como a Ouro Preto Investimentos.

As deficiências do mercado de crédito ficaram evidentes durante a pandemia, com a dificuldade de escoamento. Qual papel os fundos de crédito podem desempenhar para mudar esse cenário? E como os investidores podem se beneficiar disso também?

Não acho que existam deficiências no mercado de crédito. Tal mercado no Brasil é bastante competitivo e dinâmico. O problema das altas taxas de juros sempre esteve relacionado a três fatores: a alta taxa de juros básica da economia (Selic) que historicamente sempre esteve em patamares elevados no Brasil, ou seja, os entes públicos sempre capturavam grande parte da poupança nacional, oferecendo elevadas taxas nos títulos públicos; o segundo fato negativo é a altíssima carga tributária – a mais alta em países que estão em desenvolvimento – e, finalmente,  a grande inadimplência, ou seja, o alto risco de crédito. Esses são os três fatores que sempre prejudicaram o mercado de crédito, que são os responsáveis pelas taxas altas para o tomador do crédito.  

A queda na taxa de juros dos títulos públicos – a taxa referencial – já dará um grande impulso ao mercado de crédito privado.  

Os investidores irão se beneficiar com a gradual abertura do mercado de crédito privado ao mercado de capitais, que poderá trazer retornos bem superiores à renda fixa tradicional, baseada em títulos públicos.

A crise econômica, impactando as contas das empresas, pode afetar a confiança do investidor nos papéis de crédito privado? Como elas podem recuperar o rating em meio às dificuldades enfrentadas?

A riqueza de um país é gerada por suas empresas. É uma verdade que vale tanto para os países tradicionalmente capitalistas como para os países comunistas que lograram modernizar suas economias, como a Rússia e a China,  entre outros. Comunismo não é mais sinônimo de concentração de poder econômico, mas continua significando – mais do que nunca – concentração de poder cultural e político. Como todas as economias dependem da saúde de suas empresas, qualquer crise que afete profundamente as contas das empresas, afetará também as contas públicas e os preços de quaisquer outros ativos. Basta ver que a arrecadação de tributos caiu mais do que 30% nos últimos meses. Portanto, é uma ilusão pensarmos que uma crise de confiança nos “papéis de crédito privado” não resultaria também numa crise de confiança em toda a economia: nos títulos públicos, no valor dos imóveis ou das ações de empresas de capital aberto ou fechado.

Mas temos observado que a pandemia da COVID-19 afetou de forma muito desigual os diversos setores econômicos: embora alguns tenham sofrido muito, houve setores que foram beneficiados e alguns praticamente não sofreram nenhum impacto. Então, achamos que uma parcela considerável da economia terá uma recuperação mais rápida do que se imaginava. E existem aqueles segmentos que somente irão se recuperar com uma forte ajuda estatal e todos os governos mundiais estão conscientes disso.