Por Ana Julia Mezzadri, da Investing.com – O ano de 2020 foi atípico em todos os sentidos — e no mercado de ações não foi diferente. Em março, mês em que a Covid-19 foi decretada pandemia pela Organização Mundial de Saúde, o Ibovespa teve sua maior queda mensal em 22 anos, de 30%, e passou por seis circuit breakers (quando os negócios são congelados após o índice entrar em queda livre de 10%).
Algumas ações, no entanto, conseguiram se destacar ao longo deste ano. Até o fechamento do mercado desta segunda-feira (28), os papéis da CSN (SA:CSNA3) haviam registrado alta de 119% desde o início de 2020; seguidos por Weg (SA:WEGE3), com alta de 118%, Magazine Luiza (SA:MGLU3) (+112%); Petrorio (SA:PRIO3) (+102%); Bradespar (SA:BRAP4) (+69%); Vale (SA:VALE3) (64%); Usiminas (SA:USIM5) (+52%); Via Varejo (SA:VVAR3) (+49%); Marfrig (SA:MRFG3) (+46%); e Suzano (SA:SUZB3) (+44%).
Weg
Há uma série de motivos por trás da disparada de uma das maiores vencedoras do ano, a Weg.
“Essa escalada ao longo do ano foi atípica, mas refletiu muito os drivers da companhia. É uma companhia sólida, tem um perfil de endividamento bem diferente das outras, uma administração muito forte na questão financeira e uma saúde financeira muito boa”, explica Catherine Kiselar, analista do BB-BI.
O histórico da companhia jogou a seu favor: “Quando uma empresa performa bem no passado em uma situação de estresse, a expectativa é que ela performe bem também em uma próxima situação de crise, como a do coronavírus”, conta Kiselar. “Em um momento de crise e incerteza o investidor vai buscar um porto seguro”, completa.
A forte presença da Weg no mercado de produtos de ciclo longo também ajudou a companhia, pois são contratos que não podem ser facilmente cancelados em caso de crise. A presença internacional também foi um fator decisivo, pois além de possibilitar maiores aprendizados também diversifica o risco.
Alexandre Sabanai, portfolio manager da Perfin, traz ainda a relevância da Weg nas questões ESG como um fator importante da valorização da companhia. “Por outro lado, não basta ser só ESG, tem que ter também um lado de produto, um lado comercial, e acho que isso foi muito importante para a performance da Weg”, diz o analista.
Finalmente, Ricardo Campos, CIO da Reach Capital, destaca a vanguarda da Weg em tecnologia e inovação como um dos motivos para a alta.
Varejo
Outras empresas, como a Magazine Luiza e a Via Varejo, foram diretamente beneficiadas pela pandemia de Covid-19, que causou uma explosão nas compras online e favoreceu as companhias com e-commerces bem estruturados. “Obviamente são empresas que fizeram o dever de casa, mas teve um fator macro, de fora, que beneficiou”, explica João Beck, sócio da BRA.
B3 (SA:B3SA3)
A B3, na visão de Alexandre Sabanai, entra no grupo de companhias cujos modelos de negócio se mostraram resilientes à crise. “Ela tem um modelo resiliente e com vetor de crescimento. Resiliente porque, se fossemos apostar que uma empresa não fecharia por causa da pandemia, seria a B3”, explica.
Sabanai aponta que, além de ter se mostrado resiliente, a B3 chegou até mesmo a ganhar com a pandemia, no curto prazo. “Toda vez que a volatilidade dos mercados aumenta, o nível de volume de trading também aumenta”, o que beneficiou a companhia.
Outros vetores de crescimento para a B3 foram a forte entrada de investidores pessoa física na bolsa de valores ao longo do ano e o boom de IPOs no segundo semestre.
Mineração e siderurgia
A alta nas ações de empresas ligadas à mineração e à siderurgia, como CSN, Bradespar (holding controlada pelo Bradesco (SA:BBDC4) que detém cerca de 6% do capital da Vale), a própria Vale e Usiminas, é vista por Sabanai como uma das mais surpreendentes da bolsa neste ano.
A siderurgia foi muito beneficiada, segundo o especialista, pelo boom de construção civil e do mercado de aços planos. O fato de a maior parte das grandes empresas de siderurgia ter um braço ligado ao minério de ferro também jogou a favor das companhias.
Isso porque o minério de ferro, principal produto da Vale, passou por uma forte alta de preços, puxada pela retomada da atividade da China. A desvalorização do real frente ao dólar também foi relevante para a performance da empresa, que tem fortes atividades de exportação.
Expectativas para 2021
Na visão de Catherine Kiselar, a Weg sai de 2020 mais forte e segue sendo uma das favoritas para 2021. “Pudemos ver na prática, atestada, a capacidade da Weg de se superar, de manter seus resultados e suas entregas consistentes perante o investidor, a sociedade e ela mesma como empresa.” Em um cenário em que a indústria de bens de capital foi fortemente impactada, este certamente foi um marco para a companhia.
“Entendemos que os fundamentos da Weg permanecem fortes e que ela tem um caminho brilhante pela frente, principalmente na parte de digitalização, e que ela fez o dever de casa ao longo da pandemia. Ela saiu mais forte”, diz a analista. “Ela trouxe aprendizados que ficaram na cultura da companhia e que não vão ser jogados fora, vão ser aplicados nas suas operações e ela deve seguir resiliente ao longo do tempo.”
Outra empresa que deve manter sua forte performance, segundo Murilo Breder, analista da Easynvest, é a Magazine Luiza. “Eu continuo gostando muito de Magazine Luiza, apesar de estar tendo uma rotação de setores agora. Esse setor ficou um pouco para trás agora, mas eu acho que isso é passageiro. Todas as empresas de varejo eletrônico foram forçadas a evoluir 5 anos em 5 meses por causa da pandemia”, explica.
Ricardo Campos vai na mesma linha: “Talvez elas ainda tenham espaço para subir. Primeiro porque conseguiram criar um ambiente de círculo positivo. Elas vendem mais, conseguem entregar mais rápido, têm centros de distribuição mais próximos, aí têm dinheiro para comprar uma empresa de sistemas mais eficiente, conseguem colocar outras categorias… Criam todo um ecossistema de transação de negócios que viram muito positivo”, explica, referindo-se às grandes varejistas.
O setor de energia elétrica, apesar de não ter ficado entre as maiores altas da bolsa, também teve bom desempenho em 2020 – o que, na visão de Breder, deve se manter em 2021. Entre os nomes do setor, o analista destaca a Eneva (SA:ENEV3), “que tem uma vantagem competitiva muito forte por seu modelo de negócios”. A caminhada do Brasil em direção a uma matriz energética mais limpa também favorece a empresa por suas operações de gás natural. Campos também cita a empresa como uma de suas favoritas.
Também defensivo, Breder aposta na continuidade da boa performance do setor agropecuário, “que vem carregando o PIB do Brasil nas costas desde sempre, e em 2021 não deve ser diferente, já que estamos com uma expectativa de mais uma safra recorde”, explica. No setor, o analista elege as small caps Kepler Weber (SA:KEPL3) e Brasil Agro e a gigante SLC como preferidas.
Os exportadores de commodities devem seguir com força de uma maneira geral, desde que não haja uma forte queda do dólar, segundo Luiz Sedrani, diretor de investimentos da BV Asset. “Acho que o mundo e o Brasil continuam demandando aço. Deve ser um cenário positivo e um ano de geração de caixa e de lucro”, explica.
No setor de commodities, também a Vale deve seguir se beneficiando da alta do minério de ferro e da depreciação do real frente ao dólar, segundo Ricardo Campos.
Muitos dos analistas esperam que, além da continuação da boa performance de algumas das empresas que se destacaram em 2020, alguns setores que sofreram muito com a pandemia passem a ganhar na virada do ano.
“Eu acho que o principal fator do ano que vem vai se chamar normalização da atividade. A vida vai voltar a uma normalidade, então acredito que as empresas expostas ao consumo/varejo vão se beneficiar”, diz Sabanai, citando como exemplo o setor de shoppings, que sofreu muito com as medidas de isolamento social.
Outro setor que não passou por um bom ano e deve reverter essa tendência é o dos bancos, segundo Sabanai. “O setor financeiro também pode voltar a se beneficiar em algum momento, mas acho que mais do meio para o final do ano”, explica. Alan Gandelman, CEO da Planner, é mais enfático ao apostar nesse setor, dizendo que “os juros caíram bastante e existia uma preocupação de grande inadimplência, que não está se consolidando.”
Nesse setor, porém, Breder segue apostando na boa performance da B3, por considerar que a migração de pessoas física para a bolsa é uma tendência estrutural. O analista cita ainda o fato de a companhia ter um monopólio em sua atividade. “A B3 pega o melhor dos dois mundos: a continuação do momento atual, de home office, investidores, e ao mesmo tempo uma volta à normalidade, que significa mais IPOs, mais follow-ons…”, resume.
A retomada da economia também pode jogar a favor do setor de planos de saúde, que tende a se beneficiar da abertura de empresas e consequente contratação de planos de saúde corporativos, conforme explica Sabanai.
O analista cita ainda o setor de educação e companhias aéreas como perdedores que podem se destacar em 2021. Gandelman também aposta nas aéreas: “A Gol (SA:GOLL4) já está em recuperação, a Azul (SA:AZUL4) está com caixa positivo. Gosto dessas ações”, diz. E completa: “CVC Brasil (SA:CVCB3) será impulsionada pelo turismo interno. Como continua complicado viajar para o exterior e ninguém mais aguenta a pandemia, é provável termos um aumento do turismo interno.”