O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) discursou, nesta terça-feira (24), na abertura do debate de chefes de Estado e de governo da 79ª edição da Assembleia Geral das Nações Unidas (ONU), em Nova York.
Lula foi o primeiro líder a falar, em prosseguimento à tradição brasileira de abrir as discussões do encontro anual que reúne mais de 190 países.
O presidente esteve acompanhado da primeira-dama, Janja da Silva, dos presidentes do Senado Federal e da Câmara dos Deputados, Rodrigo Pacheco (PSD-MG) e Arthur Lira (PP-AL), respectivamente, além do ministro de Relações Exteriores, Mauro Vieira, e do assessor especial e ex-chanceler, Celso Amorim.
Em abertura, Lula fala à Palestina
Logo no início do discurso, Lula destacou o apoio à Palestina e saudou a presença do presidente Mahmoud Abbas, que integra a sessão como membro observador.
“Dirijo-me em particular à delegação palestina que integra pela primeira vez essa sessão de abertura”, afirmou o presidente.
Lula criticou as guerras e o papel da ONU nos conflitos
Em sua fala, Lula criticou a escalada de conflitos armados, como os que ocorrem no leste europeu, na Ucrânia, e no Oriente Médio.
O presidente defendeu a necessidade de fortalecer a ONU para lidar com a crescente tensão geopolítica.
“Precisamos ir muito além e dotar a ONU dos meios necessários para enfrentar as mudanças vertiginosas do panorama internacional“, ressaltou.
Lula mencionou ainda dados preocupantes sobre conflitos globais.
Para Lula, o “uso da força sem amparo da comunidade internacional“ demonstra como o “direito de defesa virou direito de vingança“.
A situação na Ucrânia, “onde a guerra se estende sem uma perspectiva clara de paz“, ilustra essa realidade, de acordo com o presidente. “Nenhuma das partes vai conseguir atingir todos os seus objetivos com o empenho militar“.
Diante desse cenário, China e Brasil apresentaram uma proposta com seis pontos para estabelecer um processo de diálogo.
Lula afirmou que a situação no Oriente Médio, especialmente em Gaza e na Cisjordânia, se agrava e pode “se estender perigosamente para o Líbano“, o que torna ainda mais urgente a necessidade de negociações pacíficas.
“2023 ostenta o triste recorde do maior número de conflitos desde a Segunda Guerra Mundial. Os gastos militares globais cresceram pelo nono ano consecutivo e atingiram mais de US$ 2,4 trilhões. Esses recursos poderiam ter sido utilizados para combater a fome e enfrentar a mudança do clima“, afirmou.
Um alerta para a emergência climática e a crise humanitária em diferentes regiões do mundo
De acordo com o presidente, as previsões indicam que o número de pessoas que precisarão de ajuda humanitária em todo o mundo pode chegar a 300 milhões este ano.
“O planeta já não espera para cobrar da próxima geração e está farto de acordos climáticos que não são cumpridos“, afirmou.
Além disso, as crises climáticas afetam regiões de forma desigual, e Lula mencionou o desastre climático no Rio Grande do Sul (RS) em maio, a maior enchente na região Sul em mais de oitenta anos, a pior estiagem na Amazônia em 45 anos e a destruição de 5 milhões de hectares por incêndios em todo o País apenas em agosto.
Lula afirmou que o seu governo “não terceiriza sua responsabilidade nem abdica de sua soberania“.
Ele alega que o País tem se comprometido em lutar contra a degradação ambiental, e afirmou que o seu governo reduziu o desmatamento na Amazônia em 50% no último ano, devido a uma postura firme contra garimpo e crime organizado.
Lula relembrou que o Brasil se prepara para sediar a COP30 em 2025 e destacou o multilateralismo como o “único caminho para superar as emergências climáticas“.
O presidente relembrou que, há mais de 50 anos, o Brasil optou por biocombustíveis e agora está na vanguarda do hidrogênio verde, em busca de uma economia menos dependente de combustíveis fósseis.
A desigualdade na raiz das crises humanitárias
Lula demonstrou preocupação com a disparidade econômica global.
Ele afirmou que a fortuna dos cinco principais bilionários do mundo dobrou no início desta década, enquanto 60% da humanidade ficou mais pobre. Diante disso, o Brasil tem enfatizado a importância da cooperação internacional. A Aliança Global contra a Fome, nesse sentido, desponta como um dos principais resultados da presidência do Brasil no G20.
O presidente criticou o baixo crescimento econômico da América Latina, que vive uma “segunda década perdida“. “Essa combinação de baixo crescimento e altos níveis de desigualdade resulta em efeitos nefastos sobre a paisagem política“, declarou.
Lula também criticou a manutenção de Cuba em listas de Estados que supostamente promovem terrorismo, e chamou a atenção para as consequências das medidas coercitivas.
Em relação ao Haiti, Lula enfatizou a necessidade de ações conjuntas para restaurar a ordem pública. No Brasil, ele destacou a defesa da democracia diante de investidas extremistas que promovem ódio e intolerância: “A defesa da democracia implica ação permanente“.
De olho nos bilionários da tecnologia e na inteligência artificial
O presidente Lula também levantou preocupações sobre o papel das plataformas digitais, que “se julgam acima da lei“, e defendeu uma inteligência artificial que promova a emancipação e a equidade, numa ênfase à importância de democratizar o acesso às novas tecnologias.
Ele falou em “assimetrias“ no acesso à tecnologia e propôs uma “inteligência artificial emancipadora“ que reflita a diversidade do Sul Global. “Interessa-nos uma inteligência artificial que também tenha a cara do Sul Global e fortaleça a inclusão“, afirmou.
Lula sai em defesa por uma reforma na ONU
Para o presidente brasileiro, a carta das Nações Unidas, que nunca passou por uma reforma abrangente, reflete um passado colonial, já que “nenhuma mulher foi secretária-geral“ e as vozes das nações africanas não são adequadamente representadas.
O número de países membros saltou de 51, na fundação da Organização, para 193, o que evidencia, para o presidente, a necessidade urgente de ações que reflitam os desafios contemporâneos da humanidade.