Muito bem, governo e mercado estão satisfeitos com a aprovação da reforma da Previdência, ocorrida na última terça-feira (23) e considerada peça-chave na agenda econômica do ministro da Economia, Paulo Guedes. Uma vez superado esse desafio, voltam aos holofotes outras medidas tidas como fundamentais para que o Brasil controle o déficit nas contas públicas, atraia novos investimentos e, assim, volte a crescer nos níveis desejados. Entre essas medidas estão as reformas administrativa e tributária, temas que devem ser objeto de debates acalorados nos próximos meses. Mas a bola da vez parece ser o novo pacto federativo, cuja proposta está em elaboração pelo Poder Executivo, com previsão de ser enviada ao Congresso na semana que vem.
Mas o que é esse tal de pacto federativo? Como ele afeta a economia? Continue lendo este artigo que a SpaceMoney vai esclarecer essas e outras questões.
O que é, afinal, o “pacto federativo”?
O nome “pacto federativo” pode parecer complexo em um primeiro momento, mas ele nada mais é que um acordo que rege as funções de cada segmento da federação. Isto é, esse pacto estabelece os direitos, as atribuições e as responsabilidades de municípios, estados e União no que se refere ao orçamento, à administração e ao financiamento dos serviços públicos.
E como esse pacto é feito, na prática? Por meio de um conjunto de dispositivos constitucionais, como respeito à autonomia dos estados e municípios, estabelecimento de prerrogativas, recursos e responsabilidades. Conforme prevê o pacto, os recursos arrecadados pelos governos, seja por meio de impostos ou outros mecanismos, como royalties da produção de petróleo, por exemplo, devem ser investidos pelos entes da federação em diferentes áreas, como saúde, educação e segurança.
No campo da segurança pública, por exemplo, a divisão de tarefas é a seguinte: os municípios organizam a guarda metropolitana, os estados financiam as polícias civil e militar e a União cuida do exército.
Zona Cinzenta
Apesar de a Constituição Federal de 1988 determinar essas competências, ela não as detalha. Por isso, acaba ocorrendo uma sobreposição de atuações, em que não se sabe exatamente no que cada parte deve agir, para onde se destinam os recursos e quem arcará com este custo.
Um exemplo disso é a repartição dos royalties do petróleo extraído nas bacias do Rio de Janeiro. Há uma discussão para definir se esse dinheiro será distribuído pelo governo estadual para os municípios ou se deve ir para a União e, de lá, ser dividido entre as demais unidades da federação
Para sanar essas dúvidas e organizar a relação entre os entes, Paulo Guedes, segundo declarações nos últimos meses, proporá uma reforma no pacto federativo.
Lei de Responsabilidade e “regra de ouro”
O Governo ainda não divulgou os detalhes do Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que enviará ao Congresso para revisar o pacto federativo. Mas, pelas declarações de Guedes, dá para se ter uma ideia do que vem por aí.
O objetivo principal do plano seria a desvinculação total do orçamento da União, isto é, não haveria, como há hoje, percentuais definidos em lei para gastos em áreas específicas, como saúde e educação, por exemplo. Além disso, a revisão pretende dar mais poder para que o Congresso, estados e municípios participem das decisões orçamentárias.
Também está prevista a criação de conselhos, ligados aos Tribunais de Contas, para aprimorar e acompanhar as contas públicas. A criação destes conselhos estava prevista desde a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), de 2001, mas nunca saiu do papel.
Mas o ponto nevrálgico da reforma está na mudança da chamada “regra de ouro” da economia. Segundo ela, o governo (em qualquer instância) não pode contrair dívidas para pagar despesas correntes, como a despesa da máquina pública, salários e aposentadorias. O governo só pode contrair novas dívidas para pagar as antigas ou fazer investimentos que possam gerar lucro futuro. Hoje essa lei só pode ser quebrada com a aprovação do Congresso, o que acaba sendo um entrave para situações emergenciais.
Segundo o gerente de projetos da Ipê Avaliações, Leandro Botelho, a retirada da “regra de ouro” abre precedentes para uma irresponsabilidade para com as contas dos municípios e estados.
“A regra de ouro deve ser mantida, porque ela impede que o governante faça gastos que não vão gerar benefícios no futuro e um próximo governante seja obrigado a responder por esses gastos. Uma coisa é se endividar com algo que trará benefício ou redução de custos.”
O problema do debate sobre a “regra de ouro” é que ela é um dispositivo que pode promover um descontrole das contas públicas. Ele faz uma comparação com o final dos anos 1980 e início dos 1990, período em que não vigorava a regra. Os estados tinham a opção de pegar empréstimos em bancos caso a arrecadação não cobrisse as despesas do período. Isso gerou um desequilíbrio fiscal que culminou na hiperinflação da época.
Atualmente, o governo só pode contrair novas dívidas para pagar as antigas ou fazer investimentos que possam gerar lucro futuro. Hoje essa lei só pode ser quebrada com a aprovação do Congresso, o que acaba sendo um entrave para situações emergenciais. Apesar de estar na agenda do pós-Previdência, Botelho não acredita que essa reforma venha a ser tão significativa. “O mais importante agora é a reforma tributária. Sem ela, as outras acabam sendo mais esvaziadas”, afirma.