Pesquisa aponta que transporte público é ambiente favorável ao assédio

De cada dez mulheres, quatro (40%) avaliam o transporte público como o lugar onde elas mais correm risco de sofrer algum tipo de assédio. Outras 25% já sofreram assédio no transporte coletivo. É o que mostra a Pesquisa Mulher- Viver na Cidade, da Rede Nossa São Paulo em parceria com o Ibope, divulgada hoje (12), na capital paulista. Para 23% das mulheres, a rua é um local de risco, e 11% temem o assédio em bares e casas noturnas.

A pesquisa entrevistou 416 mulheres de 16 anos ou mais, na cidade de São Paulo, entre os dias 4 a 21 de dezembro de 2018, e constatou que pelo menos 13% já passaram por alguma abordagem desrespeitosa – foi agarrada, beijada ou outra situação sem seu consentimento.

Para o coordenador geral da Rede Nossa São Paulo, Jorge Abrahão, o assédio no transporte público é um problema que está espalhado na sociedade e é importante perceber isso para enfrentar o problema, caso o objetivo seja desenvolver campanhas educativas, ter mais fiscalização, treinar os cobradores e motoristas de ônibus, para ter maior velocidade nesse enfrentamento.

“O transporte coletivo é o espaço que o assédio mais ocorre porque não temos feito nada para mudar essa situação. Não temos tido nenhuma discussão na sociedade, campanha. A pesquisa mostra que o assédio no transporte público está aumentando, mas acreditamos que está havendo uma consciência maior das mulheres. Podemos supor que esse é um problema grande, que já existe, e cada vez mais, com encorajamento maior, apareça mais isso”, disse.

Enfrentamento

Segundo ele, a sociedade não está mostrando um contraponto com relação ao assédio e é preciso que o poder público enfrente a questão de maneira mais forte. “Esse tipo de postura e enfrentamento nós temos tido pouco. No fundo, isso restringe o direito de ir e vir das mulheres, porque há muitas que deixam de fazer algumas atividades em função desse medo”.

Quando se fala de discriminação e preconceito no ambiente de trabalho, 19% das entrevistadas afirmaram já ter sofrido esse tipo de assédio. Em 2018, esse percentual ficou em 16%. “Isso tem muito a ver ainda com um não reconhecimento da igualdade. Isso acaba aparecendo nos salários. Percebemos que há uma desvalorização e isso, junto com a sociedade machista que temos, acaba gerando essa discriminação e esse preconceito”.

De acordo com Abrahão, as situações que acontecem nos espaços públicos tendem a se reproduzir, nem sempre na mesma dimensão, nos espaços privados. “É evidente que nesses espaços privados as empresas podem atuar fortemente, tendo meios nos quais as pessoas possam denunciar para responsabilizar pessoas. Há caminhos para avançar nisso”, ressaltou.

Entre as mulheres que sofreram algum tipo de assédio ou preconceito no trabalho, 57% veem o telefone em centrais de atendimento como o canal que mais se sentem a vontade para denunciar. As delegacias da mulher foram apontadas por 48%, aplicativos de celular por 40% e a internet por 26%.

Cuidado com os filhos

O levantamento também revelou que o percentual de mulheres que não dividem o cuidado dos filhos com outra pessoa aumentou de 27% em 2018 para 33% em 2019. Aquelas que declararam que ficam mais com o filho recuou de 43% para 36%.

“O que conseguimos perceber é que, se somados esses dois números, temos 70% cuidando sozinhas ou a maioria do tempo dos filhos. Existe a questão de como enfrentar essa divisão de tarefas, que também é um papel que a sociedade pode enfrentar. Muitos países avançam muito na lei da Licença Paternidade. Isso por si só não resolve, mas é um encaminhamento importante em relação à questão cultural que temos que enfrentar”, observou Abrahão.

O pesquisador disse ainda que a pesquisa traz a percepção de que a cidade, que é planejada pelos homens, têm um conceito de urbanização que não considera os diferentes gêneros. “Temos uma cidade com a mobilidade planejada para os homens. O tipo de disponibilidade de transporte público é mais modelado para o ir e voltar do trabalho do que para atender quem necessita cuidar mais de filhos e precisa, por exemplo, de uma frequência maior dos ônibus. Os horários de atendimento dos equipamentos públicos também são planejados somente para quem tem mais flexibilidade”.

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