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A defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) aposta em uma estratégia de redução de danos para tentar afastar os ministros Flávio Dino e Cristiano Zanin, do Supremo Tribunal Federal (STF), do julgamento da denúncia sobre a suposta trama golpista.
De acordo com informações do blog da colunista Malu Gaspar, do jornal O Globo, a meta seria criar um ambiente jurídico mais favorável ao ex-presidente e evitar que o ministro Alexandre de Moraes tenha maioria garantida na Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF).
A manobra jurídica se apoia no regimento interno do STF, que estabelece que, caso ministros se ausentem ou fiquem impedidos por mais de um mês, seus substitutos devem ser os magistrados mais antigos da Segunda Turma.
Atualmente, esses nomes são Gilmar Mendes e Dias Toffoli.
Por que a defesa de Jair Bolsonaro tenta essa estratégia?
Atualmente, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) tem sido composta por cinco ministros:
- Alexandre de Moraes (relator da denúncia)
- Flávio Dino
- Cristiano Zanin
- Cármen Lúcia
- Luiz Fux
Com a inclusão de Dino e Zanin — ambos indicados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) —, a defesa de Jair Bolsonaro considera que existe há um placar desfavorável de 3 a 2 contra o ex-presidente.
Se Gilmar Mendes e Dias Toffoli fossem convocados para substituir os dois, haveria uma chance maior de reverter o quadro ou, pelo menos, garantir uma votação mais equilibrada.
Aposta na ala pragmática do STF
A defesa bolsonarista acredita que, mesmo aliados de Moraes em diversas votações, Gilmar Mendes e Dias Toffoli pertencem à ala mais pragmática do tribunal, que leva em consideração o contexto político do momento.
“Gilmar sabe para onde sopram os ventos”, disse um influente interlocutor de Bolsonaro, que refere-se a pesquisas que indicam uma queda na popularidade de Lula.
Existe uma avaliação nos bastidores de que Gilmar Mendes já mudou de postura ao longo dos anos, e foi um dos principais defensores da Lava-Jato quando a operação atingia o Partido dos Trabalhadores (PT), mas depois alterou o discurso quando investigações passaram a envolver políticos do Centrão e da direita.
Já Dias Toffoli foi descrito como uma “metamorfose ambulante“, devido à sua capacidade de transitar entre diferentes espectros políticos.
O ministro, indicado por Luiz Inácio Lula da Silva (PT), experimentou uma proximidade com o ex-presidente Jair Bolsonaro quando presidiu o STF.
Os desafios da estratégia e os obstáculos no STF
Apesar da tentativa da defesa de Bolsonaro, a estratégia encontra barreiras.
- Dificuldade em afastar Dino e Zanin
- Para que Dino e Zanin sejam removidos do julgamento, eles precisariam se declarar impedidos ou serem afastados pelo próprio Supremo. No entanto, não existem precedentes de ministros do STF removidos de julgamentos por decisão dos colegas.
- Turma pode funcionar com apenas três ministros
- Mesmo que a defesa consiga afastar os dois magistrados, o regimento do STF permite que a Segunda Turma funcione com apenas três ministros. Dessa forma, Alexandre de Moraes poderia julgar o caso ao lado de Cármen Lúcia e Luiz Fux, e garantir maioria mesmo sem Dino e Zanin.
Flávio Dino reforça imparcialidade e nega desconforto
Em entrevista concedida nesta segunda-feira (24), o ministro Flávio Dino afirmou que não existe qualquer desconforto em participar do julgamento de Bolsonaro e garantiu que a decisão vai ser baseada nas leis e no devido processo legal.
“O julgamento vai se dar de acordo com as regras do jogo previstas na lei, com autorização e com o respeito à ampla defesa”, declarou Dino.
O magistrado já fez declarações públicas que apontava a responsabilidade política de Jair Bolsonaro nos atos de 8 de Janeiro de 2023.
“A responsabilidade política do Bolsonaro não há menor dúvida, porque ele era o inspirador. Seu silêncio após a eleição, o não reconhecimento do resultado, as reuniões que ocorreram. Quem revelou as reuniões? Senadores, deputados, parlamentares que integram a sua base de apoio e revelam reuniões golpistas nos palácios presidenciais com a presença do presidente da República.”
Cristiano Zanin e o passado como advogado do PT
A defesa de Bolsonaro também argumenta que Cristiano Zanin deveria se declarar impedido, já que atuou como advogado do PT na campanha eleitoral de 2022 e chegou a pedir a cassação do ex-presidente por abuso de poder político.
O PT foi responsável por oito das dezesseis ações que levaram à inelegibilidade de Jair Bolsonaro no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o que reforçaria supostamente o argumento da defesa de que Zanin já teria um julgamento parcial sobre o caso.
O que está em jogo no julgamento da denúncia contra Bolsonaro?
O processo que pode levar à prisão do ex-presidente Jair Bolsonaro se baseia na investigação da Polícia Federal (PF) sobre uma suposta tentativa de golpe de Estado para impedir a posse de Lula.
O relator, Alexandre de Moraes, já sinalizou que há elementos suficientes para aceitar a denúncia, o que pode tornar Bolsonaro réu no STF.
Entre os elementos investigados, destacam-se:
- Reuniões e articulações para anular o resultado da eleição de 2022;
- Monitoramento ilegal de adversários políticos, inclusive o próprio Alexandre de Moraes;
- Elaboração de um plano para interferir no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e no Supremo Tribunal Federal (STF).
Possíveis cenários para Jair Bolsonaro no STF
1. Denúncia aceita e julgamento prossegue
Se a maioria dos ministros da Segunda Turma votar pela aceitação da denúncia, Bolsonaro se torna réu no STF, e pode ser julgado e condenado.
2. Estratégia da defesa foi exitosa e embargos levam o caso ao plenário
Se a defesa conseguir modificar a composição da Turma e obter um placar de 3 a 2, pode entrar com embargos infringentes, e transferir o julgamento para o plenário do STF, onde todos os onze ministros participariam da decisão.
3. Rejeição da denúncia e arquivamento do caso
Caso o STF rejeite a denúncia, Bolsonaro pode evitar a abertura do processo criminal, o que seria considerado altamente improvável diante das provas reunidas.
Bolsonaro e seus aliados apostam na tese de perseguição política
Desde o início das investigações, Jair Bolsonaro (PL) e seus aliados políticos adotaram uma narrativa de que as ações do STF fazem parte de uma perseguição política, com o objetivo de impedir que o ex-presidente concorra às eleições de 2026.
A defesa tenta reforçar essa tese ao questionar a imparcialidade dos ministros Alexandre de Moraes, Flávio Dino e Cristiano Zanin.
Mesmo assim, a estratégia bolsonarista enfrenta fortes desafios jurídicos e institucionais, já que a denúncia contra o ex-presidente foi considerada uma das mais robustas apresentadas pela Procuradoria-Geral da República (PGR).
O julgamento pode se tornar um dos eventos mais marcantes da história recente do Brasil, com impacto direto no cenário político e nas eleições futuras.