Após mais de dez horas de uma sessão histórica, a Câmara dos Deputados aprovou, em primeiro turno, o texto-base da reforma tributária por 382 votos a 118, com três abstenções.
A proposta de emenda à Constituição (PEC) reformula a tributação sobre o consumo.
A aprovação em segundo turno ocorreu já na madrugada, aproximadamente a 1:40 da manhã. Apesar do avançado da hora, o quórum estava firme: foram 375 parlamentares simpatizantes à medida e 113 contrários ao texto.
Para ampliar a base de apoio, o relator da proposta na Câmara, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), fez mudanças de última hora.
O documento traz algumas mudanças em relação à proposta apresentada duas semanas atrás, como maiores reduções de alíquotas, isenção para alguns produtos da cesta básica e mudanças no Conselho Federativo, órgão que vai decidir as políticas fiscal e tributária.
“Apenas por se propor a facilitar a vida das empresas e a permitir mais flexibilidade à economia, a reforma deve ser vista como um avanço necessário e
positivo”, afirmou Rafael Bevilacqua, estrategista-chefe de Levante Investimentos.
A reforma se baseia na criação do IVA dual, que consiste em unificar PIS, COFINS e IPI, de caráter federal, na CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços), além de unificar ICMS estadual e ISS municipal, no IBS (Imposto sobre Bens e Serviços).
Alguns pontos foram ressaltados pela Órama Investimentos:
- – o IVA dual tem vantagens, pela simplificação, mas traz desafios como a gestão dos tributos pelo Conselho Federativo, a ser criado, com peso maior de decisão centrado nos estados do Sudeste;
- – a criação de uma lei complementar para determinar os critérios de rateio do Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional para compensar estados e municípios com as perdas de arrecadação;
- – o valor do Novo Fundo de Desenvolvimento Regional foi mantido em R$ 40 bilhões, com aporte apenas da União, embora os governadores pedissem R$ 75 bilhões.
- – municípios terão prorrogadas as desvinculações de 30% das receitas até o ano de 2032;
- – criação do “Simples do Agro”, para faturamentos até R$ 3,6 milhões;
- – isenção de tributos como IPVA e aeronaves que estejam associadas às atividades agrícolas;
- – isenção de tributos para a “Cesta Básica Nacional”, cujos itens serão definidos por lei complementar;
- – inserção do mecanismo chamado de “cashback”, que prevê devolução de impostos para determinados públicos, de baixa renda, com objetivos de mitigar desigualdades sociais;
- – a criação de um Imposto Seletivo (IS), federal, que vai incidir sobre bens e serviços prejudiciais à saúde e ao meio ambiente.
- – vai haver uma fase de transição até 2032, com alíquotas “teste”, de 0,90% do CBS e 0,10% do IBS num primeiro momento. Estima-se que a alíquota final do IVA seja em torno de 25%.
Para Lorena Laudares, cientista política e sócia da casa, a aprovação foi uma vitória importante para o governo, mas sobretudo uma demonstração de força do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), e do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos).
Em relatório, a analista relembra que Lira venceu, inclusive, a resistência por parte do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), inclusive com orientação para a bancada de seu partido votar contra o projeto, que não surtiu efeito.
“Mesmo que a PEC não tivesse os 20 votos dos deputados do PL, ela alcançaria o mínimo de aprovação de qualquer maneira”, destacou.
Quanto ao chefe do Executivo paulista, Laudares pontua que Freitas se colocou como uma voz destoante, em defesa da reforma, e parece ganhar alguma independência em relação ao grupo político que o fortaleceu.
O político apresentou sugestões que foram parcialmente contempladas pelo novo relatório do deputado federal Aguinaldo Ribeiro (PP-PB).
“A Reforma Tributária pode ajudar, de fato, no crescimento econômico em médio prazo”, declarou Laudares. Contudo, a Órama Investimentos diz ser preciso avaliar como o setor de serviços, com grande peso no PIB, vai ser efetivamente impactado na prática, assim como o agronegócio, que inicialmente foi contra a proposta.
Alguns acenos para o agro já foram feitos, mas para os estados produtores, a questão da divisão do Fundo de Desenvolvimento Regional desponta como a mais sensível.
“Como boa parte dos detalhes das mudanças vai precisar ser definida em leis complementares posteriormente, a avaliação do impacto real neste momento fica prejudicada”, completou Laudares.
Em nota, Isaac Sidney, presidente da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), cumprimentou Arthur Lira, o relator Aguinaldo Ribeiro e estendeu suas felicitações a Fernando Haddad, ministro da Fazenda, pelo “empenho e atuação conciliadora, que prestigiou as propostas que já se encontravam em tramitação”.
“O pior cenário seria ficarmos presos na falta de consenso na busca de uma reforma ideal e deixar o assunto se arrastar ainda mais por meses e anos a fio. Nos últimos anos, esse debate se intensificou e a Febraban não se omitiu. Temos obrigação, como entidade representativa de um setor estratégico, em pontuar, insistir, e defender publicamente a necessidade de perseverarmos nesta reforma estruturante. Defendemos que ela siga os seguintes princípios para o modelo tributário brasileiro: ser neutro, ser simples, ser equilibrado e ser transparente”, comentou.