A principal proposta econômica de Javier Milei, eleito no último domingo (19) como novo presidente da Argentina, é a dolarização da economia.
Para o coordenador do Instituto de Finanças da Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado (FECAP),Ahmed El Khatib,o plano para dissolver o banco central da Argentina, eliminar o peso e adotar o dólar americano como moeda legal para resolver o problema da inflação é “absurda”.
A taxa de inflação da Argentina, por exemplo, foi em média 189,99% desde 1944 até este ano, atingindo um máximo histórico de 20.262% em março de 1990.
“A ideia do presidente eleito e dos seus economistas é de que o povo argentino têm mais de 200 mil milhões de dólares em poupanças e outros depósitos no estrangeiro e noutros lugares. Quando esse dinheiro entrar em circulação, por exemplo, para pagar impostos, o Tesouro do país teria automaticamente moeda disponível para avançar com o processo, sem a necessidade de reservas no banco central nem um empréstimo internacional multibilionário para fazer avançar o novo sistema”.
Se o plano der certo, em 16 meses todos os pesos seriam trocados por dólares. Seria um processo gradual, como aconteceu no Equador, durante nove meses. Os depósitos bancários e os empréstimos também seriam convertidos em moeda estrangeira ao mesmo tempo.
Segundo o professor da FECAP, vale destacar que o banco central da Argentina não tem praticamente nenhum dólar nos seus cofres.
Uma tentativa anterior falhou há 24 anos, quando o plano de dolarização do presidente Carlos Menem não avançou porque uma crise económica e uma corrida ao peso causaram o colapso de um conselho monetário.
Além disso, a Argentina já tem dificuldades de pagar ao Fundo Monetário Internacional (FMI) um empréstimo de 57 mil milhões de dólares acordado em 2018 e renegociado em 2022, tornando altamente improvável um novo pacote de ajuda para apoiar a dolarização.
E, em última análise, a dolarização não resolverá por si só os principais desequilíbrios fiscais que levaram a Argentina a incumprir a sua dívida nove vezes, incluindo três nas últimas duas décadas.
A proposta de dolarização de Milei ganhou força na Argentina devido à esmagadora procura de estabilidade macroeconômica, após mais de uma década de inflação de dois dígitos e de feridas políticas autoinfligidas.
A inflação anual da Argentina arrefeceu para 113,4% em julho de 2023, contra 115% em junho. Este foi o nível mais elevado desde 1991. De acordo com algumas projeções, a taxa de câmbio deverá descer mais 70% nos próximos meses.
“Acredito que a dolarização não é viável no curto prazo. A Argentina não tem dólares para dolarizar e não tem acesso ao mercado financeiro para obter dólares. Essa proposta de dolarização só causaria a injeção de mais títulos argentinos nas mãos do setor privado internacional, direta ou indiretamente, reduzindo assim ainda mais o valor dos títulos argentinos. Mesmo que a dolarização de uma economia de mais de 600 bilhões dólares pudesse ajudar rapidamente a reduzir a inflação, trata-se de um processo altamente dispendioso”, completa El Khatib.