“Aqueles 30% que recebiam os menores rendimentos, todas as classes tiveram redução em relação a 2017 nesse rendimento médio, todo mundo perdeu um pouco, disse a gerente da Pnad, Maria Lúcia Vieira.
Ela informou que parte desses resultados é consequência da redução de empregos na indústria e na construção civil. A analista da Coordenadoria de Trabalho e Rendimento (Coren) do IBGE, Adriana Araújo Beringuy, afirmou que também houve impacto de pessoal empregado nas áreas de informação, telecomunicação, serviços financeiros e administrativos. “É um grupamento grande e que historicamente sempre empregou com carteira de trabalho assinada. Essa atividade perdeu bastante população ocupada e na medida em que contratava, era mais sem carteira e por conta própria. Até os setores mais formalizados começaram a absorver trabalhadores com menores rendimentos”.
Adriana Beringuy destacou o grupamento de transportes, armazenagem e correios, onde está incluída a participação de motoristas de aplicativos e o setor de alimentação, mais voltado para a informalidade, com os vendedores de quentinhas. “Há uma recuperação da ocupação com mais pessoas trabalhando, de fato a população ocupada aumenta, só que a expansão vem por meio de atividades que apresentam rendimentos menores”, completou.
“Continuaram no mercado de trabalho os que estavam recebendo mais. Quem ficava no meio foi mandado embora e recontratado sem carteira e com trabalho informal e rendimentos menores”, concluiu Maria Lúcia.
Índice de Gini
A desigualdade fica evidente também no Índice de Gini de rendimento médio mensal de todos os trabalhos, que mede a concentração de uma distribuição e que varia de zero (perfeita igualdade) a 1 (desigualdade máxima). Em 2018, ficou em 0,509, enquanto no ano anterior tinha sido de 0,501. Segundo a pesquisa, entre 2012 e 2015 houve uma tendência de redução do indicador, passando de 0,508 para 0,494. Mas a partir de 2016, o Gini voltou a aumentar para 0,501, patamar que se manteve em 2017. Nesse caso, a desigualdade pode piorar porque quem recebia menos passou a receber menos ainda.
Adriana Beringuy disse que entre 2012 e 2015, o Brasil registrou aumento na renda do trabalho, além de taxa de desocupação baixa. “Foi a época em que se falava que empregada doméstica estava ficando inviável, porque o salário estava alto. O pessoal de serviços mais básicos e comércio também estava ganhando muito. Teve um “boom” de carteira de trabalho assinada, então, e desconcentrou um pouco da renda desse período, por meio do mercado de trabalho. A partir de 2016, já aparece um cenário diferente”.
Composição
A pesquisa mostrou ainda que a participação na composição do rendimento médio mensal real domiciliar per capita, segundo o tipo de rendimento relacionado a todos os trabalhos, que é o habitualmente recebido pelas pessoas de 14 anos ou mais, representava 73,9 % em 2012 e caiu para 72,4% em 2018. Com relação a aposentadorias. subiram de 18,1% para 20,5%. Aumentou também no rendimento obtido com aluguel e arrendamento, de 2,4% para 2,5%. Com pensão alimentícia, doação ou mesada de não morador, o índice se manteve em 1,2%. Houve queda também, de 4,4% para 3,3%, em outros tipos de rendimentos, entre eles as aplicações financeiras, as bolsas de estudo, os direitos autorais e a exploração de patentes.
Transferência de renda
Em 2018, 13,7% dos domicílios particulares permanentes recebiam recursos do Programa Bolsa Família. Em 2012, o índice era maior e alcançava 15,9%. Nesse período, o rendimento era de R$ 368, enquanto em 2018 ficou em R$ 341. Adriana Beringuy disse que não pode afirmar que esse foi o motivo para a redução, mas lembrou que em 2017 houve um recadastramento dos beneficiários, que resultou em cortes, embora alguns tenham sido retomados mais tarde.
O Benefício de Prestação Continuada (BPC) era pago a 3,6% dos domicílios em 2018, o que significa 1 ponto percentual acima do registrado em 2012, quando o benefício era de 696, chegando a R$ 698 em 2018.
Para a gerente da Pnad, não é possível relacionar o número menor de benefícios ao aumento do trabalho informal. “Não há uma procura maior por trabalho informal. O trabalho informal é o que se consegue. Diante da situação do mercado de trabalho, as pessoas não conseguindo um emprego com carteira e todos os benefícios, acabam trabalhando em atividades informais ou tentando abrir seu próprio negócio”, disse.
Maria Lúcia acrescentou que, ao longo desse período, entre outras atividades do trabalho informal, houve o registro de aumento do serviço de alimentação e de motoristas de aplicativos. “As pessoas precisam pagar as contas, então o emprego informal é o que se vê que pode ser feito naquele momento. A questão da ocupação formal ou informal não tem relação com o recebimento do Bolsa Família, porque pode haver um trabalhador formal que recebe com carteira e a família recebe o programa. Por que? Porque tem tantos filhos que na hora em que faz a conta ele acaba se tornando alguém que pode receber o programa. O fato de estar ocupado ou não nada tem a ver com receber ou não o programa”, afirmou.
Ela lembrou que uma pessoa com trabalho informal não declara os rendimentos e pode ter mais facilidade para se encaixar nos critérios para o recebimento do Bolsa Família. “Quem tem carteira, tem o rendimento declarado, e quem está informalmente, não necessariamente declara aquele rendimento. Então acaba podendo conseguir um programa com mais facilidade”.
A gerente chamou a atenção também para o fato de as famílias que recebem esses auxílios terem rendimento muito menor, de fato, do que as famílias em que ninguém recebe o auxílio. “É cerca de um quinto do rendimento, enquanto as famílias que têm, pelo menos, um morador que recebe a Bolsa Família de 300 e poucos reais, as famílias que não recebem, que não têm ninguém recebendo o programa, é de quase R$ 1,5 mil. É uma diferença muito grande, e a gente vê essa diferença até na estrutura do domicílio. No acesso aos serviços e nos bens que têm”, afirmou.