“A grita geral contra a corrupção é justificável e necessária, ainda que tenha forte componente ideológico, como prova a polarização entre os que têm seus “corruptos de estimação”. Entretanto, tal indignação não pode esconder o mal maior e mais custoso: a má gestão causada pela apropriação do Estado por grupos políticos, por corporativismos sindicais do setor público civil e militar e por interesses empresariais”.
Nos meus tempos de adolescente no Colégio Dom Pedro I, no fulgurante, e até então majoritariamente nordestino, bairro de São Miguel Paulista, que fica no que hoje chamamos Zona Leste II da cidade de São Paulo, era comum as garotas terem o seu caderno de enquetes. Durante o ano, vários cadernos rodavam pelas turmas para que fossem respondidas, pelos amigos e colegas de classe e colégio, perguntas quase sempre iguais e genuinamente ingênuas, como costumava ser a maioria dos adolescentes daquele tempo.
Uma das perguntas recorrentes era qual era o nosso maior sonho para a Humanidade, algo como a manchete que gostaríamos de um dia ler nos jornais. Era o tempo da transição dos 60’s para os 70’s e as respostas para essa pergunta quase sempre remetiam a dois assuntos: o fim da Guerra do Vietnã e a cura do câncer. Nunca entendi o que um garoto ou uma garota tapuia tivesse a ganhar ou a perder com o fim da Guerra do Vietnã, mas se a pergunta era rasa não havia porque esperar respostas elaboradas. Já a cura do câncer, obviamente, todos desejavam e ainda desejam. Continuamos comemorando cada avanço da Medicina nessa luta.
Por que me lembrei disso? Porque se hoje ainda existissem cadernos de enquetes e a mesma pergunta tivesse de ser respondida por adolescentes que hoje têm entre 13 e 50 anos, são graduados, pós graduados e solteiros ou casados, moram com os pais, ou próximo , a resposta remeteria ao fim da corrupção no Brasil. Acho que nem a cura do câncer seja tão importante para alguns. É o sonho de consumo de todo brasileiro, de todas as classes, idades, partidos etc. Nada mais urgente, nada mais eficaz para nos levar ao sonho do Brasil Grande, expressão que ouvi pela primeira vez há pouco mais de seis décadas. As exceções ao desejo geral vêm apenas dos corruptos, é claro.
Apesar dessa quase unanimidade, meu primeiro ímpeto é discordar dessa interpretação, mesmo não tendo tido ainda a oportunidade de ser corrompido. Para horror dos moralistas, falsos ou verdadeiros, vivo a repetir que muito pior que a corrupção é a má gestão. Corrupção, por incrível que pareça, é mais fácil de ser detectada e, caso haja vontade, depurada e punida. O mesmo não ocorre com a má gestão, que se disfarça com maior facilidade, travestida de boas intenções, de razões políticas, interesses maiores (de quem?), projetos nacionais de desenvolvimento ou, no mais das vezes, puro populismo mesmo.
O caso Petrobras
O maior escândalo de corrupção já apurado em nossa História foi o famoso “Petrolão”. Para as perdas ocasionadas, há números e valores para todos os gostos, mas sempre na faixa dos três a dez bilhões de dólares. Impossível estabelecer com precisão, tantas foram as ramificações e atividades que deram causa ao chamado “rombo” na Petrobrás. Um valor gigantesco, sem dúvida, mas incapaz de competir com as perdas decorrentes das desastrosas intervenções do Governo Dilma na administração da empresa, sejam pelas nomeações políticas ou de técnicos incompetentes como Graça Foster (onde andará?) e outros, seja pela manipulação dos preços, tal como já ocorrera com a Eletrobrás. Justiça seja feita, Dilma não foi a primeira, nem a última, a intervir em empresas estatais na busca de soluções fáceis para problemas difíceis. A ameaça continua bastante presente e gosta de cloroquina.
A partir de dados oficiais (balanços divulgados) é possível verificar que, cessada a intervenção dilmista, já no ano seguinte, sob Pedro Parente, a Petrobrás registrava lucro e redução da dívida líquida e o valor de mercado da empresa, que era de R$ 101,3 bilhões em 2015, fechou 2020 em R$ 373,4 bilhões. Em 2019, o lucro líquido foi de R$ 40,1 bilhões, com queda expressiva em 2020 para R$ 7,2 bilhões, mas com todos os indicadores indicando uma empresa saudável e a caminho de uma total recuperação. Importante lembrar que a maior parte do chamado “rombo” não voltou para os cofres da empresa. Portanto, não respondem por essa recuperação, nem o fechamento, ainda que parcial, do ralo da corrupção pode explicar números tão robustos.
Isso não ocorre só na Petrobras. O custo da má gestão em todas as empresas e órgãos estatais é inimaginável. A quantidade e qualidade (de grande parte) de funcionários públicos concursados e comissionados, as nomeações políticas, as constantes alterações de regras, as mudanças a cada troca de governo, os erros de planejamento e execução, a inexistência de critérios objetivos de avaliação das políticas públicas e a irresistível tentação dos governantes (os outros dois poderes incluídos) de tratar como sua a coisa pública, todos esses fatores, combinados, levaram o país à situação atual, que não dá mostras de melhoria, a curto e médio prazo.
Então, a solução é privatizar? Sim, na maioria dos casos. Não de todos. Empresas estatais de determinados setores estratégicos, se eficientes e bem administradas, podem ficar nas mãos do Governo e, melhor ainda, gerarem lucros ao Tesouro. São raros esses casos, mas não há país no mundo que tenha privatizado todos os setores de sua economia. E a corrupção? Combatê-la e puni-la dentro da lei, que pode e deve ser aperfeiçoada para esse propósito.
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