Era uma vez, há muito, muito tempo atrás, no Reino da Frígia, um príncipe muito alto e bonito que, com a morte do seu pai, o rei, assumiu o trono. Devidamente coroado e com amplo acesso ao tesouro real, o novo soberano passava seus dias contando moedas de ouro e contabilizando sua riqueza. Sua personalidade mudara. Tudo o que lhe interessava era ficar mais e mais rico. Não dava mais atenção aos seus súditos, ao reino, sequer à sua vida.
Um dia, numa das raras vezes em que saiu do seu castelo, fez uma boa ação e Baco, o Deus do vinho, sendo-lhe grato, ofereceu-lhe a realização de um desejo. Um único desejo! Midas, então, – esse era seu nome – desejou que tudo o que tocasse se transformasse em ouro. E assim aconteceu: tudo o que tocava se transformava imediatamente em ouro puro! Que sucesso! Mas imagine você que a benção logo se tornou maldição, porque o rei não conseguia se alimentar, seus familiares guardavam uma distância segura dele, e tudo, ao seu toque, morria!
Por onde passava, ele deixava um rastro de morte e um despejar de riqueza — e não necessariamente nessa ordem. Midas ficou no nosso inconsciente e dessa história tiramos muitos e muitos ensinamentos. Não à toa, ela venceu os séculos e seu protagonista se tornou mundialmente conhecido.
Vou trazer essa história para o hoje: o que é, o que é? O que enriquece e mata, ao mesmo tempo?
Rastro de Morte
Rastro de morte estamos vendo por aqui, ali e acolá. No Brasil do início de 2021, mais de 200 mil brasileiros se foram. No planeta, o novo coronavírus já matou 2.000.066 de pessoas (dados divulgados pela imprensa no dia 16.01.2021), deixando sequeladas outras tantas que se encontram na estatística dos curados.
Os que não morreram ou não perderam ninguém para o vírus provavelmente foram acometidos pela morte dos sonhos e projetos. A Terra, neste momento, pode ser chamada de um imenso túmulo, por mais que doa essa comparação.
O Despejar da Riqueza
Noutro lado, e não necessariamente no mesmo lado da morte, estamos presenciando o movimento das águas da riqueza. De acordo com apresentação do Ministério da Economia, no final de dezembro de 2020, o impacto total das medidas de combate à pandemia sobre os cofres públicos ultrapassou R$ 600 bilhões. O valor representa mais de 8% do PIB (Produto Interno Bruto) brasileiro, que é a soma de todos os bens e serviços que o país produz em um ano.
E ponha 600 milhões nisso. A quantia declarada é somente a “entrada”, vem muito mais pela frente.
Mas aí você pensa: isso é despejar a riqueza no ralo… ou seja, é o empobrecimento. É sim… isso é o empobrecimento, mas a riqueza anda de mãos dadas com ele.
Pense comigo: veja que a sociedade, a que tem recursos, está correndo para ser testada rapidamente, para adquirir vacinas e não ficar à mercê da fila do planejamento do governo (que não existe). E mais, a sociedade que tem dinheiro está sendo tratada de forma diferenciada.
Não tratamento precoce, mas tratamento de ponta, como utilização de plasma convalescente, que custa em média R$ 3 mil por bolsa e é uma mera transfusão de sangue que não custava nada até 2020.
O derramar da riqueza mora aí.
Digo por conhecimento próprio… Fui infectada pelo coronavírus dia 15 de dezembro de 2020, uma terça-feira. Fiz três exames PCR, três exames de sangue, hemogramas completos e investigação de rins e fígado e mais outros específicos que não sei relatar. Fiz duas tomografias, tomei 15 injeções de anticoagulante. Comprei oxímetro e termômetros novos.
Como tenho três filhos e eles tiveram contato comigo, cada um fez dois exames de PCR e dois exames de sangue para investigação ampla. Um deles fez tomografia. Tomei remédios e ainda estou tomando. Dada a situação, médico particular que nos atendia cedo, à tarde e à noite, quando eu, por qualquer sensação diferente, imaginava estar morrendo.
Nenhum de nós precisou ser internado. Ao final, meus filhos não foram contaminados. Mas o custo disso foi alto. Agradeci a Deus todos os dias por ter plano de saúde, que custeou os exames e só. Mas o dinheiro jorrou. E ainda vai jorrar.
Quanto você pagaria para ser vacinado até o final de semana? Você que não está na fila dos prioritários… Esse é o raciocínio que temos que fazer… alguém ficará rico, e muito rico. Fato é que a economia global foi absolutamente alterada e o dinheiro mudou de mãos.
Me responda, então, se for capaz. Será o SARS-CoV-2 a reencarnação do Midas? O que é, o que é? Enriquece e mata e ao mesmo tempo?
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