São Paulo, um dos maiores centros econômicos do Brasil, enfrenta um cenário complexo marcado por alta burocracia e políticas fiscais que têm desestimulado investimentos e gerado a saída de empresas da cidade. Esse foi o diagnóstico apontado no Plano de Governo do candidato à prefeitura do município, Pablo Marçal (PRTB), ex-coach, empresário, político e influenciador digital.
No documento protocolado junto ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Marçal afirma que o ambiente desafiador resultou na perda de empregos e no enfraquecimento do dinamismo econômico local.
“A cidade de São Paulo já foi a terra da oportunidade”, mas, de acordo com o candidato, sofre com governantes ”que não priorizam a promoção da prosperidade para o povo”.
“Em vez disso, eles implementam políticas burocráticas, aumentam impostos e taxas e promovem um ambiente totalmente desfavorável ao empreendedorismo e à geração de renda”, prossegue o texto.
À SpaceMoney, Josilmar Cordenonssi Cia, professor de Ciências Econômicas da Universidade Presbiteriana Mackenzie, apontou dificuldades para o empresário implementar suas propostas — isso quando pode se considerar que algumas delas são factíveis.
Para o professor, existem até boas propostas, cuja compreensão e viabilidade, por falta de detalhamento, se tornam difíceis “até de criticar”. Cia avalia ainda outros planos que são um tanto quanto equivocados, como a intenção de descentralizar a economia pelo município.
Defesa das PPPs
Marçal defende a ampliação de parcerias com a iniciativa privada e as organizações
sociais em desestatizações, PPPs, concessões e permissões com o objetivo de “atender melhor a população, atrair investimentos e obter recursos para as políticas prioritárias”.
O candidato afirma que “algumas funções do Estado podem e devem ser delegadas para agentes que prestarão serviços de maior qualidade por menor custo”.
Na gestão desses acordos, o político diz que sua gestão vai criar “um processo adequado de seleção e monitoramento desses parceiros”.
Para Cia, as propostas “são ideias genéricas, que soam agradáveis, mas que dizem pouco”. O professor critica o plano por não ser nenhum pouco específico na questão.
“Na parte de gestão pública, tem uma menção da necessidade de um “Governo Digital” para melhorar o serviço público. Neste contexto, é citada parceria público-privada, sem especificar onde ou como ela atuaria.”
Outros pontos não detalhados por Marçal, lista o professor, são:
- – i. a falta de um plano para as parcerias já existentes, iniciadas na gestão João Dória (PSDB), a partir de 2017, em que a cidade vendeu concessões para a iniciativa privada explorar o comércio, estacionamento e restaurantes desses parques.
- – ii. a convocação por uma parceria com a administração pública na educação, especialmente no atendimento da primeira infância.
Sobre o segundo ponto, o professor especula que, possivelmente, a proposta se daria “através de um sistema de vouchers, em que os cidadãos receberiam vales que seriam usados para pagar mensalidade dos seus filhos em creches e escolas privadas”.
Educação financeira na grade curricular do ensino básico
Marçal afirma querer implementar a educação financeira no currículo escolar para que os alunos adquiram conhecimentos sobre gestão de finanças pessoais, investimentos e empreendedorismo.
“A educação financeira na escola está associada a melhores decisões financeiras na vida adulta”, declarou o candidato, no plano.
Cia aponta a medida como “um item importante e que tem o poder de melhorar a qualidade das decisões financeiras das pessoas”, mas afirma que o plano do candidato foca mais no empreendedorismo, que, apesar de também ser importante, “nem todo mundo tem condições e competência” para aderir.
Empreender no Brasil é bastante arriscado, nosso ambiente de negócios é bastante hostil para quem em investe em empresas da economia real. Assim, o foco deveria ser na educação financeira básica. E somente quando as pessoas alcançarem uma certa estabilidade financeira e uma reserva mínima, elas estarão aptas para empreender com menos riscos.
Marçal diz que pretende incentivar o espírito empreendedor nas escolas através de programas e projetos que ensinem os jovens a criar e gerenciar seus próprios negócios.
Cia observa que o Brasil lida com uma taxa real de juros (acima da inflação) de mais de 6% ao ano e, que, portanto, nesse cenário, “seria muito difícil encontrar e muito menos desenvolver um negócio que tenha um retorno maior que este“.
“Ao defender que todos podem prosperar e ser empresários de sucesso em pouco tempo, há uma receita certa para uma desilusão coletiva e uma crise econômica séria”, avalia o professor, que observa no discurso uma estratégia bem delineada.
“Esta ideia de empreendedorismo vindo de uma pessoa que ganhou a vida, um “self-made man”, pode ser muito atraente para uma boa parcela do eleitorado”, destacou.
Desburocratização e redução de impostos
Marçal destaca que a desburocratização e a redução de impostos são essenciais para criar um ambiente mais favorável às empresas.
Seu plano inclui a implementação de um sistema mais ágil e eficiente para a abertura e operação de negócios, com o intuito de facilitar a vida dos empreendedores e estimular a criação de novos empreendimentos.
“A maior parte das receitas da Prefeitura [de São Paulo] hoje advém da arrecadação de ISS e IPTU, que tiveram aumentos expressivos nos últimos anos, incompatíveis com a estagnação da renda dos paulistanos”, alega a campanha.
“Faremos uma gestão na Prefeitura com postura ativa na atração de investimentos para a cidade, para que empresas de segmentos relevantes, já consolidados na cidade, responsáveis pelas externalidades positivas – como os de tecnologia, financeiro e economia criativa, jamais deixem a cidade por falta de um ambiente favorável.”
Para Cia, a proposta seria uma medida insustentável do ponto de vista financeiro.
“O IPTU e o ISS são responsáveis por quase a metade das receitas da prefeitura de impostos. Portanto, qualquer redução destes impostos teria um forte impacto nas contas da prefeitura. Eventualmente, poderia se reduzir o IPTU de uma região ou o ISS de um tipo de serviço, mas com um aumento compensatório de outras regiões ou atividades para evitar a deterioração das contas do município.”
Na avaliação do professor, caso Marçal fosse eleito e prosseguisse com a ideia, São Paulo perderia capacidade de investimento ou, “no limite, teria problemas para honrar seus compromissos”.
“Provavelmente, um futuro prefeito teria que aumentar os impostos novamente para colocar as contas em ordem”, diz o professor.
Aumento de subprefeituras
Marçal quer aumentar o número de subprefeituras, de 32 atualmente para 96, com horário ampliado para atender à população. A proposta contradiz o discurso do candidato em tornar a máquina pública mais eficiente, de acordo com o professor.
“Seria um aumento significativo no custo de manutenção da máquina pública que, aliado a uma queda nos impostos, significa a contratação de uma crise fiscal bastante rápida”, critica.
Fundo Garantidor de Microcrédito
O plano de Marçal traz a criação do Fundo Garantidor de Microcrédito.
O fundo visa proporcionar acesso facilitado e barato ao crédito para micro e pequenas empresas. Muitos pequenos empreendedores enfrentam dificuldades para obter financiamento devido às altas taxas de juros e à falta de garantias.
Com a criação deste fundo, Marçal pretende estimular o crescimento desses negócios e impulsionar a economia local, que, de acordo com o candidato, “serão gerados por uma gestão eficiente, bem como da iniciativa privada”.
Cia avalia que não faz sentido a prefeitura entrar como garantidora do microcrédito, uma vez que sua lógica seria enfraquecida com essa atuação.
Ele explica que, geralmente, se oferece o microcrédito a um grupo de pessoas, geralmente mulheres, por serem mais responsáveis pelas suas famílias, em que, se uma não pagar, as outras são fiadoras e terão que honrar a dívida daquela que ficou inadimplente — “uma maneira barata e prática de todas fiscalizarem e ajudarem umas às outras para que ninguém saia prejudicada”.
A prefeitura poderia ter um fundo para financiar o microcrédito, de acordo com o professor. Mas, para isso, teria que contratar e organizar equipes especializadas neste tipo de operação, algo que Cia aponta como não trivial.
“Aí existiria uma oportunidade de uma parceria com ONGs (Organizações Não Governamentais) especializadas, mas a direita costuma demonizá-las.”
Descentralização econômica: as oportunidades vão às periferias
Marçal propõe a descentralização da economia, com o objetivo de levar empresas e capacitação para as periferias da cidade.
O candidato quer facilitar o acesso a crédito e recursos nessas regiões, equilibrar o crescimento econômico entre diferentes áreas da cidade, reduzir desigualdades e assim gerar novas oportunidades de emprego.
“Tais áreas serão consideradas regiões de oportunidade, para que recebam capacitação, regularização fundiária e crédito barato para investimentos em seus negócios. Neste sentido, as subprefeituras irão agregar serviços que impulsionem as vocações econômicas regionais, e conectar a sociedade civil, empreendedores e investidores”, detalha o plano.
Jornada da Prosperidade
No campo da geração de empregos e capacitação, Marçal introduz a “Jornada da Prosperidade”, um programa que visa transformar os benefícios sociais em trilhas de desenvolvimento pessoal.
O programa oferece desde acolhimento e motivação para pessoas em situação de vulnerabilidade até capacitação profissional e oportunidades de trabalho remunerado.
De acordo com o plano, o programa quer reunir “a sociedade civil organizada, parcerias privadas e programas assistenciais focados na proteção de pessoas em situação de vulnerabilidade”.
Marçal quer apoiar os indivíduos na busca pela autonomia financeira por meio de programas de capacitação e suporte contínuo.
Promoção de micro e pequenas empresas: O caminho da digitalização e o fortalecimento de parcerias
Marçal também enfoca a promoção de micro e pequenas empresas, que são vitais para a economia local.
Entre as ações propostas estão a digitalização de serviços públicos, o incentivo às compras públicas de produtos e serviços desses negócios, e a promoção de treinamentos e parcerias para educação empreendedora.
O plano inclui a criação de um ecossistema de inovação e sustentabilidade, e visa integrar pequenos negócios a centros de pesquisa e inovação.
Cia avalia que Marçal apresenta soluções que não serão de sua competência caso seja eleito.
“Todo mundo é a favor disso. É uma proposta que agrada a todos, mas sem dizer quais processos isso seria feito é difícil até de criticar. Hoje, fechar empresas é muito mais difícil do que abrir. E isto acaba inibindo os empreendedores de começar um novo negócio. Mas os maiores problemas a este respeito não são da alçada da prefeitura, mas sim das legislações e regulações estaduais e federais”.
Mapeamento das vocacões regionais: política personalizada
Finalmente, Marçal propõe um mapeamento das vocações regionais para alinhar as políticas públicas às necessidades e características específicas de cada área da cidade.
Esse enfoque personalizado tem como objetivo maximizar o impacto das políticas econômicas e garantir que as soluções implementadas atendam de forma eficaz às demandas locais.
Impulsionaremos a posição da Prefeitura de São Paulo na cadeia produtiva mundial e fazer com que a internacionalização traga consequentes vantagens e permita que a cidade esteja sempre competitiva e à frente de todas as outras no Brasil.
Cia aponta que a economia em São Paulo, de certa forma, já está descentralizada.
“Talvez seria mais inteligente reocupar o centro da cidade que passa por um longo e profundo processo de decadência econômica que deveria ser revertido. É uma região que toda a infraestrutura está praticamente pronta e tem capacidade de absorver muito mais moradores e negócios.“
Na avaliação do professor, as chances de sucesso são maiores em concentrar esforços e investimentos em bens públicos, atrair mais gente e negócios, sem deixar de integrar as regiões mais afastadas.
“É melhor para uma pessoa que mora no extremo da Zona Leste chegar ao Centro do que ter que ir até a região da Berrini – Marginal Pinheiros, por exemplo“, complementa.
Por fim, Cia menciona a necessidade que a cidade e o País têm de gerar empregos formais, de melhor qualidade.
“Empregos informais refletem a existência de atividades pouco produtivas que sobrevivem na fronteira do legal/ilegal e que fazem concorrência desleal aos negócios formais“, finalizou.