Mais de R$ 15 bilhões: o Brasil pode arrecadar esse montante com impostos aplicados nas casas de apostas esportivas, segundo cálculo do Ministério da Fazenda, comandado por Fernando Haddad (PT). Por isso, o Congresso nacional aprovou o Projeto de Lei (PL) 3.626, que regulamenta o mercado no país.
Somente em 2024, o governo federal estima arrecadar R$ 1,6 bilhão com esse setor, que agora passa a ser regido por um regime mais criterioso e de maior rigor nas casas de apostas, conhecidas como Bets no campo digital.
Para a regulamentação, Haddad estabeleceu diálogo amplo com o mercado, com os consumidores e com outros stakeholders para entender o que ou não deve ser exigido para a saúde do ambiente de apostas, para a proteção dos operadores e, principalmente, para a segurança dos apostadores.
Dados apurados pela Datahub e obtidos pelo Aposta Legal Brasil registraram que, de agosto de 2022 ao mesmo mês em 2023, houve um crescimento de 135% do setor no país.
Dada a promulgação do marco regulador, saiba como fica este mercado em 2024 e se a medida traz segurança para o apostador, nas linhas a seguir:
Como fica o mercado de apostas esportivas após aprovação da regulamentação?
A princípio, as apostas são legalizadas no Brasil desde 2018, mas a falta de regulamentação fez com que as empresas operassem sem fiscalização e proliferassem suspeitas de manipulação de resultados e de lavagem de dinheiro.
Algumas casas de apostas atuavam de forma legal, mas sem critérios, não possuíam sede no país e eram isentas de impostos.
Com a sanção da lei pelo presidente Luiz Inacio Lula da Silva (PT), as Bets precisarão de autorização do governo para funcionar no Brasil. Assim, para obter concessão, as empresas irão ser submetidas a fases de fiscalizações.
A casa deve ter sede e ser constituída no país e contar com um brasileiro como sócio, que tenha, no mínimo, 20% do capital social. E, ainda, a empresa tem que pagar uma licença de operação no Brasil, que pode chegar até R$ 30 milhões, válida por cinco anos.
Tiago Gomes, advogado especialista em Regulação de Jogos e Apostas Esportivas, e sócio do Ambiel Advogados, considera essa a medida mais importante. "Exigir que as empresas tenham sede aqui vai submetê-las à legislação brasileira, o que torna o ambiente muito mais seguro".
Além disso, estarão terminantemente proibidas as apostas de menores de idade e de pessoas que podem ter influência sobre o resultado, com isso, as casas terão que verificar a validade da identidade dos apostadores, a partir da utilização de tecnologia de identificação e reconhecimento facial.
As Bets terão obrigatoriedade de certificação dos jogos oferecidos por laboratórios independentes. "O que vai retirar muito dessa mística de que o jogo pode ser manipulado pela casa", comenta o especialista.
Segundo ele, se o jogo estiver autorizado pelo regulador, ganha aval de alguém técnico no tema "e que dirá: esse jogo não pode ser manipulado, e as chances de alguém ganhar serão sempre essas".
"Isso obviamente restringe muito a possibilidade de golpes, porque jogos que possam ser manipulados não serão autorizados, assim como as empresas que se recusarem a pagar prêmios legítimos, terão de arcar com as consequências regulatórias e legais típicas do direito brasileiro", explica Gomes.
Com isso, o advogado afirma que, "ao produzir regras que dão mecanismos de controle mais eficientes para o regulador, o parlamento dá uma clara sinalização de que os tempos de selvageria acabaram e que agora o Estado assumirá sua função fiscalizatória e promotora de um meio-ambiente saudável para esse mercado."
Como funcionarão as taxas para as empresas e para os apostadores?
Do lado das empresas do setor de apostas esportivas, a taxa vai ser de 12% sobre a receita bruta dos jogos subtraídos dos prêmios pagos aos apostadores, o chamado GGR (gross gaming revenue, na sigla em inglês).
Para os apostadores, taxa de 15% sobre os ganhos superiores a R$ 2.112.
Mesmo com a regulamentação, se o apostador se sentir lesado, há algo na lei que ele possa recorrer?
Como qualquer consumidor, o apostador tem seus direitos reconhecidos na Constituição Federal e na legislação brasileira.
Conforme o advogado especialista em Regulação de Jogos e Apostas Esportivas, em caso de lesão de direitos, o Poder Judiciário sempre pode ser acionado para reparar esse dano nas medidas da lei.
"Por isso, mais uma vez cabe destacar a importância dessa regulamentação, que obriga os operadores a estarem sediados no Brasil e submetidos à nossa legislação. Com isso, o socorro ao Poder Judiciário tenderá a ser mais simples e efetivo", ressalta.
Afinal, apostar ajuda a vida financeira dos brasileiros?
Segundo o especialista em finanças pessoais, João Victorino, mesmo com a regulamentação, as desvantagens e perigos superam o potencial de ganhos com apostas.
"Existem altas chances de perda, porque a maioria dos jogos e apostas envolvem risco financeiro, e muitas pessoas perdem mais dinheiro do que ganham", afirma.
Além disso, ele destaca que os impactos negativos na saúde mental e nas relações sociais e familiares, que podem ser provenientes das apostas.
"Por isso, com a regulamentação das apostas esportivas, a expectativa é de que seja possível arrecadar mais recursos a serem destinados à seguridade social, ao Ministério do Esporte, e ao Ministério da Saúde para, aqui uma sugestão minha, realizar campanhas de conscientização a respeito do vício em jogos de azar", comenta Victorino.
Nesse sentido, o texto determina que o ministério de Haddad vai ser responsável por regulamentar a obrigatoriedade para que os operadores das apostas esportivas desenvolvam sistemas para monitorar a atividade do cliente.
Assim, serão identificados os danos associados ao jogo, desde o momento em que uma conta for aberta.
Para isso, foram estabelecidos alguns critérios:
- – gastos do cliente;
- – padrões de gastos;
- – tempo utilizado com o jogo;
- – indicadores de comportamento de jogo;
- – contato liderado pelo cliente;
- – uso de ferramentas de gerenciamento de jogos de azar.
O Ministério da Fazenda ainda tem de regulamentar a limitação de tempo de uso — a ser acionado pelo usuário com, no mínimo, as seguintes opções:
- – 24 horas;
- – uma semana;
- – um mês;
- – qualquer outro período que o cliente possa razoavelmente solicitar, até um máximo de 6 semanas.
As apostas podem ser consideradas uma renda extra?
Por muitas vezes, os jogos das Bets são divulgados por influenciadores digitais como uma fonte de renda extra. Assim como as figuras da internet, as casas de apostas esportivas também vendem, por meio de publicidade, que as chances de vitória conseguem, sim, superar as de perda.
Mas, para Victorino, as apostas nunca devem ser consideradas como uma forma de renda extra.
"Primeiro, porque o retorno mensal da atividade é incerto – com as probabilidades e os algoritmos das casas de apostas e cassinos atuando contra você. Segundo, as chances de perda (a médio e longo prazo) são muito altas, até mesmo no curto prazo. Terceiro, quando alguém começa a ganhar com recorrência, ainda que improvável, passa a ser limitado pelas empresas, operando com volumes mais baixos ou até mesmo delas sendo banidos", afirma o especialista em finanças pessoais.
O que esperar deste mercado em 2024?
Agora no fim de 2023, segundo dados do BNL Data, o setor de apostas esportivas deve fechar com um faturamento na faixa de R$ 12 bilhões no Brasil.
Com a regulamentação em 2024, a expectativa é que o setor, ao menos, dobre essa cifra e continue em disparada. "Em termos de faturamento do setor, ele seguirá tendência de alta para o próximo ano", projeta Victorino.
Já quanto aos critérios de atuação, a expectativa, diz o especialista, é de que o governo fiscalize e garanta maior proteção à sociedade, com exigência de que seja evitada uma maior exposição de menores de 18 anos aos riscos das apostas.
O advogado especialista em Regulação de Jogos e Apostas Esportivas, Tiago Gomes, comenta que 2024 será um ano de muito trabalho, com um primeiro semestre em que os operadores estarão focados em cumprir os requisitos legais e regulamentares para obterem as licenças de operação no Brasil.
Isso porque o Ministério da Fazenda abriu espaço para uma manifestação de interesses e 134 empresas demonstraram desejo de operar no setor recém-regulado no País, "o que exibe a intensidade do trabalho nessa seara", avalia o advogado.
"Com a legislação e regulamentação entrando em vigor no início do segundo semestre, eu prevejo um mercado se acomodando ao redor desses operadores licenciados, com políticas mais claras que trarão maior percepção de que esse é um mercado de entretenimento e diversão seguros", conclui Gomes.