Por Maria Carolina*
Uma série de medidas foram tomadas, ao longo de 2020, e agora em 2021, para mitigar os efeitos da pandemia de covid-19 na economia do país. Nessa toada, a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN) reeditou um programa de renegociação de dívidas tributárias para contribuintes que perderam receita em 2020, em comparação com 2019. Neste programa poderão ser negociados tributos federais vencidos entre março e dezembro de 2020, inscritos em dívida ativa até 31 de maio.
Todavia, as medidas de repactuação de débitos divulgadas até agora desconsideram aquelas empresas com débitos não inscritos em dívida ativa, ou seja, ainda sob a responsabilidade da Receita Federal (RF).
Para quem não sabe a diferença entre os tipos de débitos, inscritos ou não em dívida ativa, esclareça-se. São dois os órgãos principais responsáveis pela arrecadação e cobrança dos tributos federais. A RF é responsável por fiscalizar e arrecadar, ou seja, pelos procedimentos administrativos da arrecadação. Já a PGFN é responsável pela cobrança de débitos não quitados perante a União. É a PGFN que providencia a inscrição em Dívida Ativa e a cobrança dos débitos (tributários ou não) perante o Judiciário (e atualmente também perante os cartórios de protesto).
Em termos gerais, a PGFN só passa a atuar quando se esgotam os meios de cobrança amigável por parte da RF.
Ocorre que, a maior parte das empresas em atividade não pode permitir, ou aguardar, que seus débitos sejam encaminhados à PGFN. Para operar as empresas precisam se manter regulares perante a própria RF. Não o estando, são impedidas de contratar e receber de órgãos públicos; participar de cadastro ou homologações perante a fornecedores e bancos; contratar financiamentos; realizar operações societárias, etc. Empresas com débitos perante a RF também são inscritas no Cadin, cadastro de inadimplentes do Governo Federal, que é consultado nas mais diversas situações, por empresas e governos.
A repactuação de dívidas tributárias acumuladas em razão da pandemia só está sendo oferecida àquelas empresas em situação econômica gravíssima, que já estão com os débitos excessivamente atrasados e a RF já desistiu da cobrança, encaminhando as dívidas para a PGFN tomar as providencias mais drásticas – inscrição em dívida ativa, protesto ou execução judicial.
Não se pode desconsiderar que os programas da PGFN são louváveis e certamente têm o condão de aliviar a situação de algumas empresas, mas na prática, são mais voltados à arrecadação de valores com poucas perspectivas de recebimento (como de empresas que já pararam de funcionar), e não à recuperação daquelas em funcionamento, mas em dificuldades.
O mais forte argumento dos opositores de um novo Refis relaciona-se ao fato de que os antigos programas, que envolviam também débitos ainda da RF, não avaliavam a situação concreta dos contribuintes, oferecendo os mesmos benefícios para àqueles em dificuldades ou não, beneficiando os chamados devedores contumazes.
De fato, se não for bem elaborado, um novo Refis poderá incorrer no mesmo equívoco dos anteriores. Contudo, esse obstáculo é facilmente superado por normas objetivas que limitem a adesão e os benefícios. Ora, se a PGFN consegue parametrizar os débitos e oferecer descontos específicos por contribuinte, porque a SRF não conseguiria? Por óbvio, os critérios não seriam os mesmos, mas nada impede que sejam também estabelecidos pela RF.
E é urgente que o governo, via Executivo e/ou Legislativo, elabore um programa que alcance os contribuintes em dificuldades econômicas, especialmente em razão da covid-19, mas não exclusivamente em razão desta, com débitos ainda perante a RF, para que possamos manter as atividades empresariais no país, sob pena de zerarmos o passivo tributário de difícil recuperação, mas também reduzirmos a arrecadação a nível ainda mais insuficiente à manutenção das contas públicas.
E não se olvide que os pagamentos com redução de juros e multas, além de salvar as empresas, que são primordiais na geração de empregos e renda, também implementam a arrecadação, objetivo imediato do Governo Federal.
*Maria Carolina Torres Sampaio é Sócia do GVM Advogados