Por Marcos Rodrigues*
Os discursos feitos pelos líderes das principais nações do planeta durante a Cúpula do Clima promovida pelos EUA foram ao encontro das necessidades ambientais apresentadas por cientistas nos mais diversos estudos desenvolvidos sobre o tema.
A julgar pela antecipação das metas de redução da emissão de gases do efeito estufa defendida por praticamente todos os participantes, há consenso em torno da necessidade de pôr em prática medidas de proteção mais efetivas ao meio ambiente. A questão é saber até que ponto a mensagem sairá do discurso.
A incredulidade ganha força quando já no dia seguinte ao anúncio da meta de duplicação dos recursos destinados a ações de fiscalização dos órgãos ambientais, o governo brasileiro sanciona o orçamento de 2021 com um montante considerado o mais baixo dos últimos 21 anos, para o Ministério do Meio Ambiente, segundo uma análise divulgada pelo Observatório do Clima.
Mão na massa
Metas não são alcançadas com palavras e sim com atitudes. E neste quesito, a julgar apenas pela política ambiental que vem sendo desenvolvida no Brasil nos últimos anos, elas estariam bem distantes.
Mas ocorre que, independentemente da vontade política das autoridades, a tarefa é realmente complexa. Para que ela se torne realizável, os ajustes necessários em busca do desenvolvimento sustentável não são de responsabilidade apenas do poder público.
Se a iniciativa privada não estiver engajada neste mesmo propósito, dificilmente os objetivos apresentados na cúpula serão alcançados, e neste sentido, ganha ainda maior relevância a letra E, relativa ao meio ambiente, da sigla ESG, que já vem atraindo a atenção do mundo corporativo nos últimos anos.
De acordo com o relatório “Sustentabilidade e Mudanças Climáticas: recursos intermediados pelo setor bancário no Brasil”, coordenado pela Febraban com apoio do Departamento de Economia da PUC-Rio, de cada cinco reais emprestados pelos bancos brasileiros a pessoas jurídicas no ano passado, mais de um real foi direcionado para empresas com atividades relacionadas a reduzir riscos ambientais e a ampliar o desenvolvimento sustentável. Desta forma, dos R$ 1,73 tri do saldo da carteira de crédito para empresas registrado em dezembro de 2020, R$ 376 bilhões foram usados em operações destinadas a atividades classificadas como economia verde.
Os números parecem indicar um despertar do mundo empresarial para uma atuação mais conectada entre a busca por lucratividade associada aos cuidados ambientais. Mas este era um patamar que até poderia ser aceitável com as antigas metas. O que o mundo assistiu na Cúpula do Clima foi a cobrança para o alcance até o final desta década de números que anteriormente estavam previstos para serem obtidos somente daqui a 20 ou 30 anos.
O que está sendo feito?
Será necessário fazer muito mais e numa velocidade muito maior do que o que vinha sendo feito. É um desafio que terá maiores chances de ser superado se for encarado de forma conjunta e não em iniciativas individuais. O ideal seria que cada segmento econômico buscasse entendimentos de compliance que pudessem resultar em autorregulações destinadas a promover as práticas relacionadas ao conceito ESG.
Como um exemplo deste tipo de atitude é possível citar a iniciativa adotada antes mesmo da cúpula pela dimensão Sustentabilidade da Agenda BC#, do Banco Central. No início do mês de abril o órgão abriu uma consulta pública que tem como objetivo incorporar na regulação os debates mais recentes sobre gerenciamento de riscos e de responsabilidade social, ambiental, e climática, aplicáveis às instituições do Sistema Financeiro Nacional.
A pesquisa também pretende incluir a ótica relativa às “mudanças climáticas” no arcabouço brasileiro, que hoje é mais voltado às questões sociais e ambientais. Além disso, o projeto visa encontrar meios de promover o fortalecimento de comandos regulatórios e de conceitos, com exemplos concretos sobre o escopo de abrangência de cada um dos três temas (social, ambiental e climático). A consulta está no ar e será encerrada no dia 5 de junho.
É tipo de atuação transparente e participativa, que reúne condições de engajar as empresas na busca por referências de compliance que resultem nas melhores práticas. O que consequentemente levará a uma aceleração dos resultados em termos de sustentabilidade, sem perder de vista a lucratividade.
Ainda tratando a questão do ponto de vista prático e não do discurso, o escritório da CEPAL no Brasil, juntamente com a Rede Brasil do Pacto Global, oferecem por meio do programa “Big Push para a Sustentabilidade”, um repositório com mais de 60 estudos de casos de investimentos para o desenvolvimento sustentável no país.
Nele são disponibilizados estudos sobre a atuação de empresas, governos federal, estadual e municipal, academias, associações etc além de uma variedade de iniciativas entre políticas públicas, planos corporativos, medidas setoriais, cooperação internacional etc. Eles são divididos em setores como infraestrutura (energia, logística, saneamento); sociobiodiversidade; educação, capacitação e pesquisa; indústria; agropecuária e uso do solo; reciclagem e resíduos; e outros.
É mais uma prova de que exemplos práticos não faltam e quem nos os tem já está na hora de adotar. Afinal, esta é a hora de fazer a coisa certa.
*Marcos Rodrigues é sócio fundador da BR Rating, a primeira agência de classificação de risco e avaliação dos sistemas de governança corporativa do Brasil