Por José Carlos Pinto, Leonardo Dutra e Lúcio Teixeira*
Apartir da Revolução Industrial, que começou no século 18, o desenvolvimento desordenado da sociedade, nas mais diversas nações, não distribuiu de maneira equilibrada as riquezas geradas pela industrialização.
Além disso, esse crescimento desordenado provocou impactos negativos ao meio ambiente, que se estenderam durante décadas e mais décadas.
Apenas em 1987, mais de dois séculos após o início do ciclo industrial na Inglaterra, uma visão mais sistêmica sobre sustentabilidade ambiental começou a ser difundida.
No documento Our Common Future (“Nosso futuro comum”, em tradução livre, – WCED, 1987), a então primeira-ministra da Noruega Gro Harlem Brundtland cunhou o termo “desenvolvimento sustentável”, que se baseia em um único e poderoso princípio: “o desenvolvimento que encontra as necessidades atuais sem comprometer a habilidade das futuras gerações de atender suas próprias necessidades”.
O documento foi resultado de anos de estudos financiados pela Organização das Nações Unidas (ONU), em torno da preocupação com as consequências das ações humanas ao ambiente natural que, ao contrário do pensamento de muitos, têm recursos finitos.
Entre as recomendações da ONU estavam: limitação do crescimento populacional; preservação da biodiversidade e dos ecossistemas; diminuição do consumo de energia; e desenvolvimento de tecnologias com uso de fontes energéticas renováveis.
A conscientização sobre o crescente desafio ambiental da humanidade teve um grande marco alguns anos depois, em 1992, quando centenas de chefes de Estado se reuniram no Rio de Janeiro para debater o assunto e estabelecer metas globais, a Rio-92.
Aos poucos, o ativismo ambiental deixaria de ser visto como secundário e entraria na agenda do setor produtivo e de governos.
Além do meio ambiente, cresceu também a conscientização global sobre a necessidade de se enfrentar as desigualdades sociais em todo o planeta. Afinal de contas, todas as pessoas têm direito a uma vida digna, independentemente de etnia, crença e gênero.
Além disso, a vulnerabilidade social também é fator de pressão sobre os ambientes naturais, acelerando a degradação dos ecossistemas. E isso, por sua vez, tende a causar maior escassez de água e alimentos, formando um círculo vicioso de deterioração da vida e da natureza.
Segundo a ONU, “o setor privado tem um papel essencial nesse processo, como grande detentor do poder econômico, propulsor de inovações e tecnologias, influenciador e engajador dos mais diversos públicos – governos, fornecedores, colaboradores e consumidores”.
Em 2005, vinte instituições financeiras, de nove países diferentes, se reuniram para definir critérios empresariais alinhados aos princípios do desenvolvimento sustentável.
Nessa época, surgiu o termo ESG, sigla de Environmental, Social and Governance (ambiental, social e governança). Inicialmente, a aplicação de critérios ESG se restringiu à gestão de ativos financeiros, visando gerar mercados mais sustentáveis e melhores resultados para a sociedade.
Porém, de lá para cá, o termo se difundiu e passou a ser usado para designar empresas e projetos com boas práticas ambientais, sociais e de governança, além de ser incorporado às estratégias de negócios e comunicações organizacionais.
Hoje, os princípios e critérios ESG estão disseminados no mundo dos investimentos e na rotina das empresas.
Somente com inovação e maior conscientização será possível avançar na descarbonização da economia, incluindo a adoção crescente de fontes renováveis de energia (transição energética), e na construção de um capitalismo mais inclusivo, que dê acesso igualitário à educação, ao trabalho, à saúde, à cultura e ao lazer a todos os cidadãos, independentemente de origem, crença, orientação sexual e etnia.
Para estimular a aceleração da incorporação desses valores pelas organizações, as instituições que financiam projetos empresariais têm um grande poder em suas mãos.
Porém, ESG está se tornando também um assunto cada vez mais presente na cabeça dos consumidores, notadamente os mais jovens, que usam seu poder de escolha para dar preferência a produtos e serviços com impactos positivos ao meio ambiente e à sociedade.
Nas redes sociais, aumentam os questionamentos — e até boicotes — a marcas associadas à degradação ambiental, discriminação de minorias e ao desrespeito à legislação, ou mesmo que se mostrem desconectadas dos valores e do ativismo da nova geração.
Em 2020, chegou a pandemia da Covid-19, que acelerou ainda mais a digitalização das relações interpessoais, potencializou as desigualdades sociais e escancarou a crise ambiental.
Tudo leva a crer que o mundo está em um ponto histórico de inflexão no que se refere às agendas ambiental e social, motivado pela situação de urgência provocada pelas mudanças climáticas e pela vulnerabilidade de pessoas e países de baixa renda.
Há um consenso crescente no ambiente empresarial, nos governos e na sociedade em geral de que é necessário enfrentar, com mais consistência e cooperação, a desigualdade social e a crise ambiental — principalmente sua face mais nítida e potencialmente catastrófica: a das mudanças climáticas.
Nesse sentido, a agenda ESG se tornou um terreno fértil para que as sociedades superem, ou pelo menos minimizem drasticamente, suas principais disfunções e caminhem para um novo ciclo de desenvolvimento sustentável.
Outra tendência crescente no mercado é a cobrança por diversidade. A maior conectividade proporcionada pelas redes sociais aumentou a adesão a essa causa.
Não basta mais, para as organizações, mostrar modelos de etnias diferentes em suas propagandas. Delas são cobradas ações afirmativas dentro da própria empresa, com oportunidades iguais para a ascensão profissional de mulheres, pessoas negras, pardas, LGBTQIA+ e com deficiência.
Quando uma empresa é, de fato, ESG, ela endereça todas essas questões e, portanto, está mais preparada para gerenciar os riscos e as incertezas dos negócios, bem como para se adaptar às oscilações e novas exigências do mercado. Assim, ela se torna mais competitiva.
A jornada de evolução, no aspecto social, é longa e árdua, mas não há outro caminho. É preciso incorporar os valores de inclusão, diversidade e impacto social, abandonando a visão simplesmente filantrópica nos negócios.
Desde a governança, na formação da liderança, na formulação de estratégias, na criação de produtos e serviços, nas métricas de desempenho, no compliance e nas relações com o público estratégico, os stakeholders.
É preciso viver e acreditar com sinceridade nesses valores, mudando o paradigma dos negócios e passando a praticar um capitalismo consciente e inclusivo, visando à geração de valor a ser compartilhado entre todos os stakeholders.
*José Carlos Pinto, sócio-líder de Mercados da EY Brasil.
*Leonardo Dutra, diretor executivo de Sustentabilidade e Mudanças Climáticas da EY Brasil.
*Lúcio Teixeira, sócio-líder da área de Corporate Finance da EY Brasil.