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Consumidor compra mais no digital, mas loja física continua o epicentro do varejo, diz EY

Novas tendências foram discutidas durante o NRF 2022, um dos mais prestigiados eventos do varejo no mundo

- Tânia Rêgo/Agência Brasil
- Tânia Rêgo/Agência Brasil

Apandemia de Covid-19 alterou os hábitos do consumidor, que passou a comprar mais pela internet. Mas as lojas físicas continuam importantes para o setor de varejo, cujo futuro deve ser híbrido – meios físicos e digitais à disposição do consumidor. Aderir ao “figital” – combinação dos meios físico e digital de consumo – é o grande desafio do setor para atender plenamente o consumidor em sua experiência de compra. 

Esse foi um dos temas debatidos durante a National Retail Federation (NRF), um dos mais prestigiados eventos anuais globais dedicados às tendências do varejo, em todo o mundo. Em sua 110ª edição, realizada janeiro em Nova Iorque (EUA), o evento voltou a ser presencial e contou com a participação de representantes do varejo e de consultores de todo o mundo. Durante os dias do evento, foram debatidos temas como o varejo pós-pandemia, supply chain, o metaverso em varejo, sustentabilidade e outros. 

“Em nenhum momento foi posto em dúvida a importância das lojas físicas. No meio “figital”, o grande desafio é como entregar boas experiências para o consumidor nessa nova realidade, tanto nos canais digitais como nos físicos, de forma coesa e consistente para o negócio”, explica Natália Sperati, sócia de Business Transformation para Consumer Products e Retail da EY. Ela foi uma das representantes da consultoria EY no evento e aponta, em entrevista exclusiva à Agência EY, as tendências do setor. 

O que é o evento National Retail Federation (NRF)? 

É um evento que discute o setor mundial do varejo. É o maior do setor e um dos mais relevantes em termos globais. Este ano voltou a ser presencial, trazendo muitas informações referentes ao impacto da pandemia no setor de varejo e as tendências para o cenário atual e futuro.  

O que mudou no setor de varejo com a pandemia de Covid-19? 

A pandemia acelerou alguns processos importantes, principalmente o avanço do digital e da tecnologia dentro do setor, tendo como preocupação central uma boa experiência para o consumidor. Foram debatidas as tendências e o cenário macroeconômico mundial.

Foi colocado como a pandemia impulsionou algumas vertentes tecnológicas importantes para o varejo, mas não desconsiderando o canal físico, que ainda é essencial para o setor e será vetor de crescimento durante muito tempo ainda.

Em nenhum momento foi posto em dúvida a importância das lojas físicas, muito pelo contrário. No meio “figital” (combinação dos meios físico e digital), o grande desafio é como entregar boas experiências para o consumidor nessa nova realidade, de forma coesa e consistente para o negócio.   

Como deve ser a divisão do meio físico e do digital para o varejo nessa nova realidade pós-pandemia? Eles serão complementares? 

Essa divisão não deveria sequer existir. O que existe é um negócio como um todo, que tem de ser consistente e coeso nos seus mais diversos canais de comunicação com o cliente, sejam digitais ou físicos.

É necessário ser coeso e conciso nas mais diferentes formas de falar e vender o seu produto, seja de forma digital, física ou híbrida.   

Eles se complementam, então? 

Eles se complementam, isso é parte do negócio. Para as novas gerações, sequer existe. Para as novas gerações, essa divisão entre físico e digital nem existe, pois o conceito sempre foi o híbrido. 

Qual é o papel das lojas físicas e das digitais? Qual é a importância e o destaque de cada uma dentro do negócio como um todo? 

São complementares. Tanto no meio físico como no digital, o importante é como você pode entregar a melhor experiência na jornada de compra ao consumidor, independentemente do protagonismo de um meio ou de outro naquele momento. Dessa maneira, é essencial entender e trabalhar com o modelo híbrido, para que essa jornada seja cada vez mais fluida e com melhor experiência para o consumidor.  

O próprio consumidor ora quer comprar no meio digital e ora no físico, não? 

Exato. É esse vai e vem em um meio e outro. Mais uma vez: não há uma ruptura entre o digital e o físico. E as empresas não devem tratar o físico e o digital de maneira isolada. Essa divisão nem deveria existir.

Eu sou a voz do consumidor e a voz do consumidor diz que toda hora ele está em um mix de experiências de compras. Ora estou no e-commerce, ora no social commerce, ora estou na loja física. Tudo isso está dentro de uma mesma jornada.  

Qual é a diferença do Brasil e da América Latina em relação ao restante do mundo em termos de experiência no varejo? 

Nós somos muito mais pessoais. Nós temos algumas relações que trazem mais essa pessoalidade ao processo de compra. O Brasil ainda tem modelos híbridos de atendimento ao consumidor que trazem esse lado mais pessoal, mais próximo do ponto de vista da humanização.

A tecnologia é muito importante, mas, às vezes, ela fica meio impessoal, conforme o processo que é digitalizado. Em alguns serviços de atendimento ao consumidor, notamos a tecnologia em um nível muito elevado, impessoal, o que não é bom.

Há empresas que instalam processos tão digitais que no momento em que você precisa de um atendimento humano para ouvir o seu problema com o produto, ele não existe ou é de difícil acesso.  

Muitas vezes a pessoa não consegue explicar o seu problema para a empresa porque o SAC é totalmente digital e o consumidor deseja falar com alguém da empresa. É complicado isso, não? 

A pessoa quer alguém para ouvi-la no outro lado da linha, pois o problema dela é diferente de todas as opções disponíveis no canal digital, por exemplo. Portanto, uma boa experiência pode ser não apenas um atendimento exclusivamente digital ou exclusivamente pessoal, mas sim híbrido.

Cada empresa precisa entender o modelo que mais se adequa à expectativa do seu cliente e isso pode ser, inclusive, a volta do atendimento humano versus o inteiramente automatizado com robôs/chatbot.

Durante a NRF 2022, uma empresa levou sua experiência em que entendeu que o SAC deveria ser humanizado, já que compreendeu a frustação que o cliente tinha quando se deparava com robotização.

Parece loucura? Sim, de um ponto de vista de custo a curta prazo, porém a empresa percebeu que, no longo prazo, a frequência e a fidelidade do cliente aumentavam, o que mais entregava melhor retorno no investimento – seja por gastar menos na retenção seja por custo de aquisição de clientes (CAC) no alto.

O segredo pode ser entender onde, nessa jornada do consumidor, o varejo deve entrar com um atendimento humano mais próximo, para que essa jornada completa seja positiva. 

Com a pandemia, o comércio eletrônico avançou cinco anos em poucos meses. E o brasileiro, de certa forma, ainda não estava tão acostumado com o comércio eletrônico. Diante disso, quais são os grandes desafios do comércio digital de agora em diante para que essa jornada seja completa e positiva para o consumidor?   

O comércio eletrônico cresceu três vezes mais do que o varejo físico no Brasil. É necessário trabalhar muito a questão da personalização.

No NRF deste ano, foi apresentada uma pesquisa em que 60% dos consumidores afirmam que fazem pesquisas no on-line, mas retiram suas compras no off-line. Por isso, é importante trabalhar a coesão e a solidez nos diferentes canais.

Se a loja opera só no digital, por exemplo, talvez seja importante ter um ponto físico para atendimento ao consumidor. O mesmo raciocínio vale para quem está apenas no físico hoje em dia.

As pessoas gostam do híbrido (digital e físico). Elas querem os canais on-line e off-line à disposição.

Além disso, é importante lembrar que o Brasil ainda tem baixa penetração no digital. É importante investir também na rapidez e na confiabilidade da entrega. A cadeia de entrega tem de ser muito eficiente, pois ela é parte da proposta de valor do consumidor. 

A pandemia mudou muitos hábitos em relação ao consumo? 

Nós percebemos durante a pandemia que, muitas vezes, a fidelidade do consumidor a uma determinada marca diminuiu. Por quê?

Porque as opções durante a pandemia foram restritas, e tal restrição (apesar de externa e não inerente a um específico negócio), fez com que o consumidor se visse obrigado a buscar alternativas para manter seu consumo.

E, a partir do momento em que ele experimenta outra marca, me torno menos fiel, dizem as pesquisas. Logo, a presença nos mais diferentes canais é muito relevante.  

Com todos esses avanços, como o varejo físico deve se rearranjar? Qual é o futuro dos shoppings centers, por exemplo?  E as grandes redes que possuem grandes estruturas físicas que demandaram muito investimento? Como vai ser essa adaptação? O que fazer com toda essa infraestrutura já instalada e onde foram investidos muitos recursos? 

O físico não perderá a sua importância, ele apenas vai ter um novo significado. Ele é parte fundamental no processo de consumo. Muitos pontos físicos durante a pandemia, por exemplo, se tornaram importantes como pontos de distribuição de produtos.

As lojas físicas foram parte fundamental da cadeia distributiva de produtos. Sem elas não seria possível tamanha rapidez e adaptabilidade dessa integração das vendas digitais.

As lojas também continuam parte importante da experiência do consumidor, tão relevante quanto o digital, ou até mais relevante.

O National Retail Federation mostrou que o meio físico continua com uma parcela enorme no papel de compra por parte do consumidor. Muitas vezes a pessoa pesquisa no digital, mas quer conhecer o produto na loja.

Ou então ela precisa de um atendimento mais personalizado antes de adquirir determinada mercadoria, por exemplo.

O importante é que o meio físico de varejo continua sendo muito importante.

O que pode acontecer é utilizar parte da estrutura física da loja como ponto de distribuição e da cadeia logística, até mesmo o caminho inverso, em que as lojas físicas trazem o digital, com catálogos digitais, click & collect, realidades aumentadas etc.