Em seu primeiro Boletim de Mercado de 2020, divulgado na última quinta-feira (30), a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) revelou que a captação do mercado de capitais, formado pela bolsa de valores, corretoras de valores mobiliários e outras instituições financeiras autorizadas, foi 62% maior em 2019 do que no ano anterior.
O levantamento da CVM também mostrou que o mercado de dívidas representou 63% dos R$ 450 bilhões investidos nas diversas aplicações de renda fixa e renda variável.
Mas por que o mercado de capitais aumentou tanto em 2019? E por que os títulos privados de dívidas, incluindo as debêntures, os Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRI) e os Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRA), representam parcela tão grande desse universo?
Para responder essas perguntas, ouvimos um gestor de recursos de terceiros e um assessor de investimentos. Veja a opinião deles a seguir:
Selic na mínima histórica
O Brasil vive a menor taxa de juros de sua história, em 4,5% ao ano (sendo que o Copom pode baixá-la para 4,25% ainda no primeiro trimestre de 2020). Com isso, as aplicações financeiras mais tradicionais entre os brasileiros, como a caderneta de poupança e o CDB, tornaram-se menos atrativas, aumentando a procura por outros ativos.
“A queda na Selic fez com que diversos investidores buscassem diversificação em outros ativos. É necessário sair da zona de conforto, que é o dinheiro parado no CDB do banco, por exemplo. Outro fator foi o crescimento de plataformas [de investimento] como a XP, que possibilitou às pessoas físicas, com um ticket mais baixo, terem acesso a diversos produtos”, explica Jorge Augusto Saad, sócio da gestora de recursos de terceiros Amazônia Capital.
Segundo Saad, o momento econômico atual do Brasil é saudável para os investimentos, após a forte recessão pela qual o país passou. “Desde 2013 nós tivemos intercorrências políticas, o impeachment, o governo Temer, foi um período de recessão muito séria e com uma volatilidade política muito grande. Com a eleição de 2018 sendo resolvida com um desfecho favorável ao mercado, assumiu um governo com agenda liberal, de austeridade fiscal e monetária, tirando várias dessas nuvens do radar”, comenta.
Mercado de dívidas
Como mencionado acima, o estudo da CVM mostrou que os papéis de dívida foram os que mais captaram recursos no mercado de capitais. São exemplos: Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRI), Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRA), notas promissórias e debêntures. Sendo assim, nesse grupo, o destaque ficou para as emissões de debêntures, que somaram R$ 185,8 bilhões dos R$ 286,6 bilhões do total desse mercado.
Para o sócio da Ipê Investimentos Sérgio Brito, as empresas aumentaram a emissão desses papéis porque os juros de longo prazo diminuíram. “O que as empresas passaram a fazer: elas recompram a dívida de curto prazo e estendem as dívidas de longo prazo, porque os juros são mais baixos. Então, elas emitem papéis dessa dívida e o investidor compra pelo grau de risco”, comenta.
Tesouro direto
Com o cenário de juros mais baixos e inflação controlada, o ganho real de investimentos como o Tesouro Direto é cada vez menor. “Um título do tesouro que pagava 6% em ganho real, hoje não paga 1%”, diz Sérgio. Como alternativa, ele recomenda os papéis de dívida privada, porque, segundo ele, com o bom momento da economia, é muito difícil uma empresa “quebrar”.
“Vale dizer também que CRIs, CRAs, debêntures e debêntures incentivadas são livres de IR (Imposto de Renda), enquanto nos títulos do tesouro incide Imposto de Renda”, conclui.
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Número de ações
O boletim da CVM ainda revela um aumento no número de emissões de ações em 2019, que atingiram R$ 90,1 bilhões. Assim, a quantidade de papéis disponíveis na bolsa de valores é maior e aumenta a possibilidade de novos investidores entrarem no mercado. Saad, da Amazônia Capital, acredita que o momento é positivo porque as empresas também perceberam que é um bom momento de buscar outras formas de captar dinheiro. “Ainda tem muito espaço para uma maior diversificação”, afirma.
Oferta primária de ações (IPO)
Quando as empresas buscam formas de financiarem seus projetos, elas podem optar por lançar uma oferta primária de ações (IPO, em inglês), quando elas abrem seu capital para o mercado. Em 2018, a bolsa brasileira teve três aberturas de capital e, no ano de 2019, cinco.
Então, além da burocracia para uma empresa entrar na bolsa, Saad destaca que o momento econômico também dificultava a abertura de capital. “As empresas não iriam querer fazer suas ofertas com preços ruins. Aí elas olham [atualmente] a possibilidade de valuation [valor de mercado de uma empresa] na bolsa, então é natural que elas venham ao mercado captar esses recursos”.