Já comentei aqui que está muito difícil escrever algo original sobre política e economia nos dias que correm. Ambas estão monotemáticas, ainda que cada uma delas tenha seus pontos de interesse específicos. Talvez porque prefira e me divirta mais quando escrevo sobre futebol. Nunca sobre o futebol do dia a dia, análises das rodadas ou performance de jogadores e times. Interessam-me as estórias do futebol, de times grandes e pequenos, de craques e cabeças de bagre e, principalmente, de nós torcedores e nossas paixões. Se conseguir colocar um pouco de humor na estória, então, me sinto plenamente satisfeito.
Entretanto, trato é trato. Meu acordo com a Spacemoney, livremente negociado, impõe-me o foco nos dois assuntos e a seriedade que eles exigem. Ainda que as ações e declarações de economistas e políticos sejam pratos cheios para humoristas e psiquiatras, é preciso mais que vontade para escrever um texto de humor. É preciso talento. Colocado o “nariz de cera” e feita a autopropaganda para os sites esportivos, vamos ao tema.
Na economia foi superada, sábia e rapidamente, a discussão sobre o grau de intervenção do Estado; da mesma forma já chegamos ao consenso entre Executivo e Legislativo quantos às medidas de emergência visando ao amparo imediato dos mais vulneráveis, assim como para as empresas, em especial, as micros e pequenas. Longe de estarem completas e suficientes, tais medidas serão revisadas e revalidadas, se e quando necessárias, enquanto perdurar o atual cenário.
No campo da Economia a grande discussão, que deverá estender-se durante muito tempo e gerar intensos debates, é o impacto das despesas de enfrentamento a pandemia e da decorrente crise econômica nas contas públicas. Não há dúvidas de que tal impacto será altamente expressivo, com previsões de que o déficit nas contas publicas, hoje em torno de 75% do PIB, salte para 100% ao final deste ano.
As divergências começam nas discussões ao financiamento desse déficit, que, claramente, não poderá ser feito através de políticas fiscais. Resta, portanto, a política monetária e seus instrumentos: emissão de dívida pública, manejo da taxa de juros, utilização das reservas e até a emissão de moeda pelo Banco Central. Há argumentos prós e contra para todas essas hipóteses e, como de hábito, a melhor solução deverá ser um mix de todas elas, em grau a ser determinado pela discussão e negociação política entre o Governo e o Congresso.
Outra discussão relevante no campo econômico é como será a economia pós pandemia. Não se trata de discussão antecipada ou precipitação. Em paralelo ao enfrentamento das crises sanitárias e econômicas, é preciso começar a pensar e construir esse futuro. A partir de um quando que não se conhece, formulam-se questões importantes: até quando? Quanto precisamos gastar? Quanto podemos gastar? Quem precisa mais de ajuda? Quais setores sobreviverão? Quais naufragarão? É saudável a dependência industrial do Brasil e do mundo frente a China?Certamente, há muitas outras relevantes perguntas a serem respondidas e, felizmente, elas já vêm sendo discutidas, por enquanto pelos estudiosos que as depuram e aperfeiçoam, até que cheguem aos políticos, que terão a decisão final.
Nos dias de hoje, mais do que em nenhum outro período da Humanidade, convém valorizar a Ciência e esta diz que as melhores soluções vêm das melhores perguntas. Pensar é algo como aquelas dores que os pré-adolescentes sentem e que não têm nenhuma explicação. Os pediatras socorrem as aflitas mães explicando que são as dores do crescimento: doem, mas nos fazem crescer.
Já na política tudo se resume a tentar entender as diatribes do Presidente da República. A irracionalidade de muitas de suas muitas declarações e, felizmente, poucas decisões no combate ao COVID 19, seu comportamento agressivo, sua insegurança psicológica, seu obscuro histórico no Parlamento e sua tendência a buscar crises institucionais que lhe permitam bravejar contra a democracia e os demais poderes.
Teve a oportunidade rara de unir o país num objetivo comum, superar as feridas de uma campanha eleitoral a ser esquecida e abrir diálogo com todas as camadas da sociedade. Optou por permanecer em sua trincheira de guerra, confiante em sua legião de seguidores, defensores de uma “democracia direta”, que para eles significa o governo de e para a maioria que o elegeu. Nenhum espaço para a divergência, nenhum ouvido para os outros, tido como inimigos deles e da “Pátria”. Atemoriza aos democratas reais saber que essa legião representa de 15 a 20% do eleitorado, mas somos confortados ao lembrar que ela chegou a ser 35% em tempos bem recentes.
Frente à tempestade perfeita, ou seja, a conjugação das crises sanitária, econômica e política, a parte sã da sociedade brasileira se pergunta: onde está a esquerda? Seu partido mais popular não deveria estar comandando a oposição? Não seria o caso, diante de uma crise dessa magnitude, a criação de um gabinete paralelo formado por suas principais lideranças e por partidos aliados, que formulasse sugestões de políticas públicas? Quais são suas propostas para a Economia e para a Saúde? Quais são seus planos para 2022? Quando a esquerda vai entender que precisa enfrentar a questão da corrupção, tema dos mais caros à sociedade brasileira? Vai buscar uma aliança responsável e viável para enfrentar o caos bolsonarista? Ou vai apresentar pela sexta vez seu eterno candidato, o outro Messias, único a ter soluções para todos os problemas? Onde estão os economistas dos governos Lula e Dilma? Onde andarão Guido Mantega, André Singer, Nelson Barbosa e outros? Por que não “reabilitar (como na China de Mao e a URSS de Stalin) o brilhante sanitarista, Eduardo Jorge, um dos pais do SUS na Constituição de 1988 e deixado à margem dos governos petistas por sua pureza (ou ingenuidade) ideológica e ética.
Não há resposta convincente para nenhuma dessas perguntas, exceto sinais de que o pior ainda está por vir. Parece evidente que o Messias II não abrirá mão de sua candidatura e que nada se fará, pelo menos em seu partido, em busca de alternativas. Será a prova cabal e definitiva de que a esquerda não tem projetos, nem idéias e, pior de tudo, não tem futuro. Pobre Brasil. Sem uma oposição digna desse nome, no campo profissional da política, as opções tornam-se estreitas, limitadas e podem conduzir ao radicalismo gerado pelo confronto entre os que não se sentem representados e aqueles que se arvoram em vencedores e, representados na Presidência da República, bradam aos quatro ventos: “ Ao perdedor, as batatas”.