Começa hoje (24) no Itau Cultural, na Avenida Paulista, região central da capital, a mostra a_ponte, que inclui 14 espetáculos teatrais de 11 estados. Os participantes foram selecionados entre 230 inscritos de todas as regiões brasileiras. Assim, o festival pretende apresentar um panorama da produção de artes cênicas estudantil e universitária do país. “Eu acho que a gente tem um scanner interessante, porque tem todas as regiões, interiores, não só as capitais”, afirma a gerente de Artes Cênicas do instituto, Galiana Brasil, a respeito da representatividade da seleção. A programação é gratuita e vai até o dia 4 de fevereiro.
A partir do material recebido pela curadoria da mostra, Galiana diz que a produção atual dos jovens atores e diretores parece estar fortemente ligada com temas da atualidade. Segundo ela, mesmo quando são usadas referências consolidadas da dramaturgia universal, são feitos paralelos com assuntos do momento. “A gente viu vozes com temas muito parecidos de lugares muito distantes. Questões muito urgentes, questões políticas, da atualidade, de gênero, de raça, discussões de empoderamento das mulheres e violência sob vários aspectos”, comentou sobre os trabalhos.
Poucos recursos
As linguagens também são múltiplas. Parte dos espetáculos se aproxima mais da performance ou até da dança, outros usam recursos audiovisuais, como projeções e vídeo. No entanto, Galiana diz que prevalece a ênfase na atuação, com poucos recursos extras, cenários e figurinos discretos. “Teve uma cena limpa também, sem muitos apetrechos, Uma coisa muito do ator, o texto, a relação entre os atores. A cena protagonizando mais do que os recursos estilísticos. Você não vê grandes figurinos, iluminação”, ressalta.
Esse tipo de produção que, segundo Galiana, também busca uma aproximação com o público, por outro lado reflete a infraestrutura dos estabelecimentos de ensino técnico e universitário do país. “Diz muito da realidade de assimetria dos cursos, das universidades no Brasil, da falta de recursos. De você não ter um espaço muito completo do ponto de vista tecnológico”, avalia. Ela destaca, porém, que era justamente esse tipo de criatividade que se pretendia trazer para a mostra. “Era o que a gente estava buscando, esse teatro que se reinventa de falta de tudo”, acrescenta.
Trabalhos em desenvolvimento
As apresentações são ainda uma forma de os diversos grupos se conhecerem e amadurecerem o próprio trabalho. “Por mais que os temas se toquem, a forma de falar é diferente. Desde a forma óbvia do cantar do meu sotaque ao jeito de colocar essas coisas em cena, são tecnologias diferentes. A primeira lição pedagógica dessa mostra é perceber essa diversidade de falar da mesma coisa de fomas diferentes”, diz a responsável pelo núcleo de artes cênicas do instituto.
A produção, destaca Galiana, precisa ser entendida nesse contexto de desenvolvimento. “Esse aspecto do mal resolvido, do não totalmente acabado, também faz parte dessa etapa de formação. E eu acho que ele vai se completar nesse contato com o público, com o outro, com esses profissionais que vão estar provocando”, completa. Além das apresentações, serão realizadas mesas de discussão com profissionais da área para falar com os estudantes sobre os espetáculos
Valorização
A mostra também é um espaço para valorizar o teatro feito nas universidades, na opinião de uma das participantes, Mirela Gonzalez. “A gente sabe que os trabalhos que nascem nas universidades muitas vezes não têm subsídios para continuar”.
Com o Coletivo COATO, a estudante da Universidade Federal da Bahia chega a São Paulo com o espetáculo Eu é outro: ensaio sobre fronteiras, dirigido por Marcus Lobo. “É um espetáculo diferente, Não traz uma poética realista. A gente propõe um espetáculo mais performativo”, descreve brevemente sobre a proposta estética.
O trabalho foi desenvolvido em duas residências, uma na capital paulista e outra em Salvador, e já é apresentado há dois anos pelo grupo. De acordo com Mirela, a peça trata não só de temas concretos, como as migrações e os refugiados, como fala de fronteiras e formas de separação entre as pessoas. “É um espetáculo que fala sobre todas essas fronteiras que são criadas, geográficas, pessoais, emocionais, todo o espaço que divide um indivíduo de outro”, resume.
A programação completa pode ser vista na página do Itau Cultural.