Se você perguntar a um indivíduo se ele gostaria de ganhar dinheiro facilmente, sem grandes esforços, certamente ouviria a resposta: “sim!”. Num cenário econômico adverso como o brasileiro, são cada vez mais comuns golpes como as pirâmides financeiras, que seduzem milhões de pessoas em vulnerabilidade ou iludidas pela possibilidade de ganhos rápidos.
No dia 15 de março deste ano, a Comissão Especial de Pirâmides Financeiras, força-tarefa do Conselho Nacional de Defesa do Consumidor (CNDC), alertou a população sobre a expansão dessa prática.
Na ocasião, o coordenador-geral do Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor, Leonardo Marques, elencou à Folha de S.Paulo um conjunto de fatores que hipoteticamente contribuem para isso: “Pode ser que o pagamento das verbas rescisórias decorrente das demissões com a crise da Covid-19 e o auxílio emergencial tenham agravado o problema”. Marques avaliou que a liberação do saque de contas ativas do FGTS e os juros baixos da Selic também têm sua influência.
Para o profissional, a falta de rendimento em investimentos comuns, como a caderneta de poupança, leva a população a procurar alternativas que ofereçam lucro de maneira rápida e fácil. Dessa forma, mais pessoas passam a se expor a aplicações arriscadas. De acordo com o CNDC, algo que dificulta a extinção dessas fraudes são as punições pouco eficientes.
Mas o que são pirâmides financeiras?
Pirâmides financeiras são os famosos golpes em que um investidor paga uma quantia para entrar num esquema e a remuneração ocorre por indicação de terceiros para o grupo – estes deverão atrair novos membros e assim sucessivamente. Foram nomeadas assim porque são as pessoas da base, as últimas a entrarem, quem garantem o lucro dos que estão no topo. No Brasil, a prática configura crime contra a economia popular (Lei 1.521/1951). Assim que os aplicadores param de entrar, o esquema não tem como cobrir os retornos prometidos e entra em colapso. Em alguns casos até há venda de produtos, mas apenas para ocultar o esquema fraudulento.
Como identificar as pirâmides?
Além das promessas de ganho fácil, altos lucros e retorno garantido, golpistas prometem bônus a quem conquistar novos clientes. Esses esquemas são fáceis de desmascarar visto que não apenas faltam informações sobre o produto fornecido, como também estão ausentes informações básicas sobre a empresa responsável pelos negócios, a aplicação do dinheiro e a trajetória dos donos.
É preciso tomar cuidado para não confundir pirâmide financeira com a tática de ‘marketing multinível’ – modelo de negócio baseado numa rede de contatos, em que há distribuição de serviços ou mercadorias. Nos EUA, por exemplo, as regras definem que 70% da receita de uma empresa que utiliza o marketing multinível deve ser proveniente das vendas. O objetivo é justamente impedir que “empresários” de má fé utilizem o sistema para criar pirâmides, nas quais as principais fontes de renda são os investimentos feitos pelas pessoas que aderem ao esquema.
O que faz a CVM
Dados do Relatório de Atividade Sancionadora Anual de 2020, da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), divulgado em 30 de março deste ano, mostram que foram realizadas, ao todo, 175 denúncias de esquemas de pirâmide financeira. O número está incluído entre os 325 comunicados de atividades infracionais – como ofertas ilegais de produtos de investimento e casos de corretoras fraudulentas -, reportados à CVM no ano passado pelos Ministérios Públicos Federal e Estaduais.
A análise de eventuais crimes envolvendo pirâmides não está na competência da CVM, e, por isso, tais indícios, quando identificados, são comunicados ao Ministério Público. No entanto, a autarquia oferece, através do Serviço de Atendimento ao Cidadão (SAC) e seu site, informações sobre a regularidade de propostas de participação em oportunidades de negócios.
Uma proibição específica da CVM se refere ao Forex, mercado financeiro descentralizado destinado a transações de câmbio não regulado pela Comissão. Representantes estrangeiros de corretoras que atuam com esse mercado estão terminantemente proibidos de fazer recrutamento de clientes no Brasil. A aplicação da modalidade, entretanto, ocorre livremente em outros países, o que permite a brasileiros a investirem lá por risco próprio.
Redes sociais, criptomoedas e transações digitais sofisticam o crime
As redes sociais formaram um terreno fértil para golpistas se comunicarem com mais pessoas a curto prazo e longo alcance para aplicarem seus esquemas. Com a popularidade das moedas digitais em ascensão, sem normas mais explícitas e regulatórias no Brasil, a modalidade das pirâmides financeiras se sofisticou ainda mais.
Um dos casos emblemáticos mais recentes envolve Danilo Vunião Santana Gouveia, que se apresenta como Danilo Dubaiano, criador da D9 Clube Empreendedores. Mesmo foragido da Justiça brasileira por prejudicar milhares de brasileiros e causar um prejuízo em torno de R$ 200 milhões, ele criou uma empresa que supostamente realizava apostas esportivas que nunca foram confirmadas, com investidores lesados no Brasil e no exterior.
Após um investidor realizar aportes na D9, os lucros eram pagos em Bitcoin. O esquema oferecia rendimento diário de até 33% pela moeda digital. As pessoas eram estimuladas a criar uma conta virtual, fazer um depósito para comprar bitcoin e depois chamar outras pessoas para os negócios.
Portanto, recomenda-se aos interessados no mercado de criptomoedas – ainda sem regulamentação consolidada no Brasil -, que pesquisem sobre a moeda na qual há interesse e a corretora que está comercializando.
As chegadas do Pix e do WhatsApp Pay também devem criar novos focos de fraude. Por isso, é bom ficar atento ao realizar transações por esses meios. Em campanha recente para divulgar o Pix, a Febraban (Federação Brasileira de Bancos) enfatizou a necessidade de proteger os dados pessoais e suspeitar quando receberem mensagens que solicitem dinheiro de forma urgente.
Fui vítima de um golpe. O que devo fazer?
O Ministério Público recomenda que a vítima faça denúncias no próprio órgão (federal ou estadual) ou às polícias federal e civil. O Ministério Público Federal, por exemplo, disponibiliza salas de atendimento ao cidadão. Outro meio de denúncia é a Comissão de Valores Mobiliários (CVM).