O clima já era de atenção no ano passado, mas poucos esperavam a crise que viria em 2020: a pandemia de coronavírus trouxe incertezas e imprevisibilidade que poucos investidores projetavam. No primeiro trimestre, o Ibovespa desvalorizou mais de 35%. Se você pensa em começar a investir em meio às incertezas desse momento, existem opções interessantes – mas analistas alertam que todo cuidado é pouco.
“Investir, por mais que se fale, não é trivial como se é vendido. Primeiro, se pratica a base do que é investimento: requer planejamento, dedicação e conhecimento”, resume Fábio Gallo, professor de Finanças na Fundação Getúlio Vargas (FGV). “Começa com a pergunta básica: qual é meu objetivo?”. Com a pandemia, o questionamento ganha mais importância ainda.
Já Diogo Figueiredo, sócio da gestora de recursos de terceiros Amazônia Capital, diz que é preciso conhecer seu perfil de investidor, se é conservador ou agressivo. Uma pergunta que pode ser essencial neste momento é “quanto risco estou disposto a tomar com meu dinheiro?”.
“Antes de colocar parte do seu dinheiro disponível em ativos voláteis, de risco, [renda variável, como alguns fundos e bolsa de valores] tem de entender muito bem a capacidade de tomar risco e a tolerância a ele”, diz Figueiredo. Além disso, é preciso pensar quanto dinheiro poderá ficar retido e rendendo no longo prazo sem necessidade de saque.
“Ter conhecimento e aprender o que é risco, as condições, conhecer mais sobre cada um dos ativos e das possibilidades de investimento. Tudo isso é importante para não se perder”, diz Fábio Gallo, da FGV.
E, claro, conhecer a relação de risco e retorno do investimento. “Sempre há essa relação, não adianta pensar que vai investir hoje para tirar daqui alguns meses”, afirma o professor da FGV.
Para quem é mais conservador
Para quem não se sente seguro em entrar na bolsa agora, com tanta imprevisibilidade, a renda fixa pode ser um ponto para onde correr. Na segunda-feira (13), o Banco Safra atualizou sua carteira mensal recomendada aos investidores, aumentando a porcentagem de renda fixa nos portfólios, com otimismo no médio prazo.
Desde o ano passado, devido à queda de juros, a rentabilidade dos ativos de renda fixa, caiu a níveis considerados não atrativos (podendo até chegar a ser negativa). A Selic, taxa de juros básica definida por um conselho do Banco Central (BC), está em sua mínima histórica, a 3,75% ao ano. “Mesmo assim, deve haver contas e entender que existem títulos que trazem retorno, pouco, mas melhor que nada”, diz Fábio Gallo, da FGV.
Como exemplo de opções de renda fixa que podem ser interessantes no momento, ele cita títulos do governo, tesouro nacional, Letras de Crédito Imobiliário (LCIs) e do Agronegócio (LCAs). E Certificados de Depósito Bancário, o CDB. A dica é comparar a relação dos ganhos líquidos dos títulos, isto é, retirar os custos do rendimento bruto. “Muitos fazem a conta no valor nominal, mas é preciso comparar em termos líquidos, com referência mínima da inflação, além de pagamento de imposto de renda”, diz o professor.
Sérgio Brito, sócio da Ipê Investimentos, destaca o CDB de bancos menores. “Há uma taxa atrativa e Fundo Garantidor de Crédito [entidade que administra proteção a investidores em caso de falência, intervenção ou liquidação da instituição financeira], que reduz o risco. Empresas que sofrem com a demanda vão lançar dívidas, e pode ser bom momento de comprar com taxa interessante, mesmo com juros menores”, diz.
Para quem quer arriscar mesmo assim
Segundo o sócio da Amazônia Capital Diogo Figueiredo, no caso da renda variável é preciso definir quanto dinheiro se está disposto a “perder” nas oscilações. Ele traz um exemplo prático: “se eu colocar R$ 200 mil e virarem 150 mil, vou ficar desesperado ou tranquilo? Se for tranquilo, posso investir, se não, preciso diminuir a cota. E isso vale para qualquer época.”
Nessa hora, ganha quem tem o tempo a seu favor, já que é imprevisível dizer se ações valorizarão no curto prazo. A crise chama a atenção por não ser fundamentalmente financeira, e se o isolamento social se alongar por muito tempo, grandes riscos vem aí.
Em geral, Figueiredo não recomenda comprar ações nem dívidas de empresas com geração de caixa em situação frágil, e está focando nos “transatlânticos”, companhias que suportariam mais tempo de economia parada e já se destacavam antes como líderes.
O professor da FGV é mais cético. “o início é entrar em contato. Em termos normais, seria entrar em um fundo de ações de corretoras, simular, conhecer mais”, afirma. “Em um ambiente como esse, não é [hora] de experimentar. Toda renda variável, fundos de maneira geral, imobiliários, ações em particular, tudo há risco e ele sobe.”
A curto prazo, todas sofrerão o baque. No futuro, Figueiredo destaca alguns setores, como “shopping, varejo, bancos, de distribuição de combustível, educação, saúde, tecnologia, setor de energia elétrica e logística.”
Brito, da Ipê, também acredita que é mais seguro apostar em empresas sólidas com anos de história, consideradas resilientes. Fundos de investimento, segundo ele, são uma possibilidade, desde que o investidor pesquise aqueles que caíram pouco, de “gestoras renomadas, com equipe bem qualificada que se mantém, estratégia definida e histórico vencedor”, diz.
Mas isso não significa que é hora de sair jogando dinheiro sem estudar o mercado.
Fábio Gallo finaliza com ponderamento. “O mercado está difícil. Estamos no meio da pandemia, ninguém sabe o que acontecerá efetivamente com nosso dinheiro”. Sua preocupação é o grau de incerteza sobre o momento da crise atual, que não permite “experiências.”
Para ele, quem se lança ao mercado de ações neste momento deve estar ciente dos riscos e ter cabeça fria. “Investir sem cuidado é apostar”, diz. Entre perdas econômicas – estar em posição de baixa -, deve se tomar cuidado para que não sejam, também, financeiras, ou seja, vender imediatamente em posição de prejuízo, que tornaria a perda definitiva. “As pessoas precisam estar atentas nisso. Não é simplesmente uma loteria, é racional.”